domingo, dezembro 17, 2006

Contradições das subculturas (I)

Estava eu no outro dia no ginásio - não frequento ginásios por burguesismo mas por questões de saúde - e, enquanto as minhas pernas e os meus braços descreviam enfadonhos movimentos elípticos, pus-me a olhar para a televisão, que estava sintonizada na MTV. Entre vídeos de mulheres louras com pouca roupa e africanos com capuzes enfiado na cabeça em dia de sol, demorei-me a interpretar os vídeo-clips de música rap e de hip hop. Vi com mais atenção os do rapper Sean John 'Diddy' Combs (na foto). E pus-me a pensar...
A música rap e o hip hop são ritmos produzidos pela subcultura dos jovens afro-americanos. Esta subcultura negra surge como contestação aos valores e ao domínio da hegemonia branca e como afirmação de uma identidade afro-americana alternativa. Pelo menos, assim foi pensada e as letras das músicas apontam nesse sentido.
No entanto, contestei com tristeza que alguns vídeos de rap e de hip hop (vários!) fazem a apologia do estilo de vida branco. Nos vídeos de Diddy, por exemplo, o rapper aparece em cena conduzindo carros desportivos italianos (Ferrari ou Lamborghini), usando fatos de fino corte (caros, certamente!) e gravatas a condizer. No pulso não traz as "correntes da segregação" de que falava Luther King mas a corrente de um Rolex. Conhece em discotecas chiques africanas que usam vestidos de noite chiques (Versace? Armani?) e leva-as para a sua casa sofiticada e chique. Aí bebem champanhe e ouvem a música emitida pelas colunas de uma aparelhagem do último modelo. Resumindo: temos condensados em quatro minutos os símbolos e valores da hegemonia branca well-off, endinheirada, de classe média-alta. Ora, estes deviam ser precisamente o modo de vida e os valores que a música rap e hip hop pretendiam combater. Mas, desta forma, não é isso o que acontece.
Lembro-me que os saudosos Sex Pistols também misturavam dois símbolos antagónicos nas capas dos seus álbuns: a "A" dos anarquistas e a suástica. Ligava-os um elemento comum: ambos eram símbolos de recusa, de contestação, de nihilismo cultural e político; ambos eram símbolos de revolta contra o sistema. Diddy e alguns rappers recorrem a símbolos do poder branco que oprime a sua raça: o champanhe, o Rolex, o Ferrari, o fato italiano. Talvez o façam porque achem que a ideia de estilo se constrói com artefactos da classe média-alta branca. Que engano! Que confusão ideológica!

5 Comments:

Blogger Xor Z said...

Então, caro Alexandre, P. Diddy devia aspirar a viver de tanga numa choupana ou, como diz aquela canção foleira, um amor e uma cabana? Neste caso, tenho alguma dificuldade em compreender onde quer chegar.
Cumprimentos

12:31 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Provavelmente até são videos de crítica transmitida através da excessiva ostentação.

12:07 da tarde  
Blogger Raimundo_Lulio said...

Caro Alexandre,

Essa confusão ideológica é para os pensadores neoliberais a prova que a história chegou ao fim. Para mim, essa confusão ideológica significa, apenas, a dominação absoluta do pensamento submisso.

6:05 da tarde  
Blogger Alexandre Dias Pinto said...

Não, Sr.ª Flor dos Alpes. Esses vídeos podiam, de facto, ser uma denúncia da ostentação, como insinua. Mas não são. São mais de culto de uma opulência a que querem dar o nome de "estilo". E porque concluo que não há neles uma intenção crítica? Porque falta lá a piscadela de olho, o gesto de denúncia que levaria o espectador a chegar à sua conclusão. Não é o que acontece.

12:24 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

os videos mostram a cultura da marginalidade, dos que estão nas prisões. como vc acha que o cara conseguiu os itens caros... trabalhando como um branco otario é que nao foi.., em muitos videos sao mostradas armas. o racismo alegado é apenas uma desculpa para a rapacidade e a preguiça. esse estilo de musica, com a subcultura correspondente, e que encontram no brasil expressão no funk carioca e pagode baiano, induzem à gravidez precoce, eliminação de homens capazes de apoiar famílias resultando em desagregação que gera uma nova remessa de crianças problema, adultos marginais.

9:56 da tarde  

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