terça-feira, abril 22, 2008

"O Navio de Espelhos", Mário Cesariny

Este "Navio de Espelhos" é mais lírico e simbólico do que o "Há uma hora". Quase se trata de uma pequena alegoria. Alegoria de quê? Deixo ao leitor a liberdade de interpretar. Solicitam-se interpretações aos mais afoitos.
Segundo Cesariny, o mote para esta composição poética foi o conto "Manuscrito encontrado numa garrafa", de Edgar Allan Poe. Nesta breve narrativa, o narrador, que sobrevive ao naufrágio do seu barco, é recolhido por um navio misterioso. Mais misteriosa é ainda a tripulação de personagens fantasmáticas, que são como que clones de um mesmo molde e que parecem existir num mundo paralelo.
Voltando ao poema de Cesariny, retenho estes versos inspiradores:

"Quando um se revolta há dez mil insurrectos
(Como os olhos da mosca reflectem os objectos)"

1 Comments:

Blogger Alexandre Dias Pinto said...

O NAVIO DE ESPELHOS

O navio de espelhos
não navega, cavalga

Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível

Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos

(Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele)

Os armadores não amam
a sua rota clara

(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)

Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga

(O seu porão traz nada
nada leva à partida)

Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta

(E no mastro espelhado
uma espécie de porta)

Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto

(A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto)

Quando um se revolta
há dez mil insurrectos

(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)

E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo

Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)

Do princípio do mundo
até ao fim do mundo

11:02 da tarde  

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