"Albufeira, 5 de Agosto de 1987"
« Deambulo por estas ruas atulhadas de automóveis e de turistas, a ouvir falar a Europa. É uma algaraviada de línguas, que se cruzam indiferentes umas às outras, aéreas, sem pés no chão, e que são entendidas aos farrapos pela avidez indígena. Compro um quilo de figos, bem nossos, bem castiços, e atravesso aturdido a onda sonora, no pânico de que possa um dia alastrar ao resto do país, e a desejar das veras da alma que um terramoto arrase este cosmopolitismo e Portugal regresse aqui na sua plenitude, a gente a ser gente, o idioma pátrio a ter dignidade, as casas carácter, as virtudes estatuto, e a terra volte a estar coberta de amendoeiras, figueiras e alfarrobeiras, secas de sede por fora e verdes de esperança por dentro. A nação inquieta reencontrada no seu paraíso terreal e a inquieta a sonhar o longe do seu cais natural. »
Miguel Torga, Diário, vol. XV.
Miguel Torga, Diário, vol. XV.
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