"Nazaré, 12 de Agosto de 1969"
[ No seu dia de aniversário. ]
« (…) A pobre luz natural do meu espírito nunca quis ceder o passo a qualquer claridade sobrenatural. Enfrenesiou-se sempre em ser ela o único sol que me guiava. E era alumiado por tão precária candeia que queria descobrir a verdade nas trevas da minha noite humana! (…) Daí o terror com que vejo aproximar-se o fim, onde só posso chegar no pavor biológico de bicho consciente. (…) »
Miguel Torga, Diário, vol. XI.
« Coimbra, 12 de Agosto de 1991.
[ Numa reunião de amigos, festejando os 86 anos de idade. ]
(…) Todos sabemos, clara ou brumosamente, que nascemos sós, vivemos sós e morremos sós. E que, até nas horas menos infelizes, no mais fundo do nosso inconsciente, lateja, cruciante, a dor incurável dessa condenação. Mas sabemos também que a Bíblia, o livro dos livros, nos ensina que não há homem sem homem, e que o próprio Cristo teve, a caminho do Calvário, a fortuna dum Cireneu para o aliviar do peso da cruz. O que, trocado por miúdos, significa que a solidão radical de cada existência – que, nos poetas, a cegueira de Homero ilustra premonitora e paradigmaticamente -, é mitigada por uma força que, se não vence o destino, inconformadamente desde sempre o desafia. Essa força, de que nenhum de nós ignora o nome e as virtudes, tem feito, entre outros, o milagre de nos juntar nesta data e tornar festivo um acontecimento que o não foi. (…) »
[Dois anos depois, a reunião foi a 14.]
« Malaposta, 14 de Agosto de 1993.
(…) Toda a vida humana é uma breve ou demorada despedida, que começa, de facto, logo à nascença, e acaba aparentemente no dia da morte. (…) O homem é um mistério encarnado, opaco a maior parte das vezes aos olhos mais penetrantes. Por isso ninguém conhece verdadeiramente ninguém. Mas os poetas mostram-se sempre como são. Não por serem mais sinceros, mas por imposição da própria poesia. Porque irrompe das profundezas ígneas do ser, quando se manifesta traz à tona a verdade ainda a fumegar. (…) »
Vol. XVI (os dois).
« (…) A pobre luz natural do meu espírito nunca quis ceder o passo a qualquer claridade sobrenatural. Enfrenesiou-se sempre em ser ela o único sol que me guiava. E era alumiado por tão precária candeia que queria descobrir a verdade nas trevas da minha noite humana! (…) Daí o terror com que vejo aproximar-se o fim, onde só posso chegar no pavor biológico de bicho consciente. (…) »
Miguel Torga, Diário, vol. XI.
« Coimbra, 12 de Agosto de 1991.
[ Numa reunião de amigos, festejando os 86 anos de idade. ]
(…) Todos sabemos, clara ou brumosamente, que nascemos sós, vivemos sós e morremos sós. E que, até nas horas menos infelizes, no mais fundo do nosso inconsciente, lateja, cruciante, a dor incurável dessa condenação. Mas sabemos também que a Bíblia, o livro dos livros, nos ensina que não há homem sem homem, e que o próprio Cristo teve, a caminho do Calvário, a fortuna dum Cireneu para o aliviar do peso da cruz. O que, trocado por miúdos, significa que a solidão radical de cada existência – que, nos poetas, a cegueira de Homero ilustra premonitora e paradigmaticamente -, é mitigada por uma força que, se não vence o destino, inconformadamente desde sempre o desafia. Essa força, de que nenhum de nós ignora o nome e as virtudes, tem feito, entre outros, o milagre de nos juntar nesta data e tornar festivo um acontecimento que o não foi. (…) »
[Dois anos depois, a reunião foi a 14.]
« Malaposta, 14 de Agosto de 1993.
(…) Toda a vida humana é uma breve ou demorada despedida, que começa, de facto, logo à nascença, e acaba aparentemente no dia da morte. (…) O homem é um mistério encarnado, opaco a maior parte das vezes aos olhos mais penetrantes. Por isso ninguém conhece verdadeiramente ninguém. Mas os poetas mostram-se sempre como são. Não por serem mais sinceros, mas por imposição da própria poesia. Porque irrompe das profundezas ígneas do ser, quando se manifesta traz à tona a verdade ainda a fumegar. (…) »
Vol. XVI (os dois).
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