"Coimbra, 28 de Novembro de 1991"
« Não há dúvida. Perdi. Ou ganhei, quem sabe lá? Talvez a perder tudo é que se ganhe tudo. De qualquer maneira, acabo vencido. Nada do que fiz valeu a pena, me serve agora de lenitivo nestes tormentosos dias finais, que vou sofrendo em silêncio, crucificado na cama, a fazer esforços sobre-humanos para minorar aos olhos das visitas, e aos meus, o espectáculo confrangedor da minha miséria. A respirar oxigénio por um tubo e sem forças para erguer uma palha, nem mesmo assim a encanzinação da escrita me deixa em paz. Às duas por três, sinto a tentação de registar miudamente estas horas de agonia. Mas tenho de me render à evidência. A caneta cai-me da mão aos primeiros rabiscos. E ainda bem. Nasci para cantar a glória da vida e não para cronista da humilhação da morte. »
Miguel Torga, Diário, vol. XVI.
Miguel Torga, Diário, vol. XVI.
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