O “PESSIMISMO NACIONAL” ( 2 ) : ETIOLOGIA
«Ora eu creio que o valor do pessimismo em Portugal não tem sido justamente apreciado, e parece-me que esse sombrio prognóstico a respeito dos nossos destinos como povo é ainda, mais do que uma conclusão rigorosamente deduzida, um fenómeno meramente sentimental, derivado desse mesmo pessimismo que está florescendo no nosso país, luxuriosamente, como uma venenosa árvore de morte.»
Para Manuel Laranjeira, o pessimismo, “como a imensa maioria das outras perturbações de que o Homem sofre”, pode ter duas origens: ou é sintoma duma “dificuldade adaptativa passageira” e, neste caso, uma reacção normal de ajustamento do organismo colectivo a novas condições da vida ambiente; ou tem “uma génese francamente mórbida” e, nesta hipótese, “exprime um conflito irredutível, que só termina pela morte”; isto porquanto há “um esgotamento senil ou degenerativo, doloroso, e indica o estado desesperadamente agónico dum povo como entidade colectiva.”
O autor destas palavras quer crer na primeira hipótese. Então, de o que se trata e como se trata… “isto”? Parece uma questão de simples golpe de vista: “Basta lançar os olhos para o estado social português para se compreender imediatamente”… E eis o que o olhar radiográfico do nosso médico vê: “Somos um povo civilizado… na aparência, porque a negra realidade é que quatro quintos da população portuguesa nem sequer sabem ler e escrever. Vestimos à moderna, pretendemos viver à moderna, e pensamos e sentimos à antiga. Somos um povo pertencendo pelo aspecto aos tempos dos Direitos do Homem e pertencendo, na verdade, pelo espírito, aos tempos da pedra lascada.” E quanto ao quinto restante? “Existe uma minoria reduzida, uma parcela, embora mínima, que acompanha a civilização moderna e vai nas correntes do pensamento contemporâneo.” Esta “elite pensadora e civilizada” apresenta um “avanço educativo relativamente acentuado.” Mas não se salva duma lascada crítica. A fracção é uma fractura: “ essa minoria não sabe ou não pôde impor-se à maioria da nação a arrastá-la consigo nesse avanço progressivo”… para a tal “civilização moderna”.
Quanto aos “quatro quintos”, eram uma massa de inércia sem vontade própria e demasiado pesada para ir “nas correntes”? O caso era que: “Somos um povo sem comunidade de pensar e sentir”, dividido e desequilibrado. Ora, os organismos, individuais ou colectivos, carecem, para se adaptarem e sobreviverem de uma unidade e equilíbrio derivados da “estreita sinergia dos seus elementos” e, “em Portugal, essa sinergia não existe.” Precisamente “aí está o nosso mal-estar.”
O médico avisa: “se o equilíbrio não for restabelecido de maneira que a engrenagem social portuguesa volte a funcionar sinergicamente; se esta ficção de organização não for destruída e substituída por uma organização una e harmónica – a nossa existência como nação, como sociedade autónoma, será efémera”; acabaremos como uma “nação morta, condenada a ser devorada pelo ventre esfíngico e insaciável das nações vivas.”
Nestes artigos para O Norte, Manuel Laranjeira não diz quando é que, na nossa história nacional portuguesa, teria existido um tal “equilíbrio”, que agora deveria ser “restabelecido”. Mas terminava, no dia 31 de Dezembro de 1907, com uma nota de esperança: “Eu creio que sim, que isto se pode salvar ainda…”
Veremos como; mas, antes da terapêutica, ainda algumas patogénicas complicações.
Para Manuel Laranjeira, o pessimismo, “como a imensa maioria das outras perturbações de que o Homem sofre”, pode ter duas origens: ou é sintoma duma “dificuldade adaptativa passageira” e, neste caso, uma reacção normal de ajustamento do organismo colectivo a novas condições da vida ambiente; ou tem “uma génese francamente mórbida” e, nesta hipótese, “exprime um conflito irredutível, que só termina pela morte”; isto porquanto há “um esgotamento senil ou degenerativo, doloroso, e indica o estado desesperadamente agónico dum povo como entidade colectiva.”
O autor destas palavras quer crer na primeira hipótese. Então, de o que se trata e como se trata… “isto”? Parece uma questão de simples golpe de vista: “Basta lançar os olhos para o estado social português para se compreender imediatamente”… E eis o que o olhar radiográfico do nosso médico vê: “Somos um povo civilizado… na aparência, porque a negra realidade é que quatro quintos da população portuguesa nem sequer sabem ler e escrever. Vestimos à moderna, pretendemos viver à moderna, e pensamos e sentimos à antiga. Somos um povo pertencendo pelo aspecto aos tempos dos Direitos do Homem e pertencendo, na verdade, pelo espírito, aos tempos da pedra lascada.” E quanto ao quinto restante? “Existe uma minoria reduzida, uma parcela, embora mínima, que acompanha a civilização moderna e vai nas correntes do pensamento contemporâneo.” Esta “elite pensadora e civilizada” apresenta um “avanço educativo relativamente acentuado.” Mas não se salva duma lascada crítica. A fracção é uma fractura: “ essa minoria não sabe ou não pôde impor-se à maioria da nação a arrastá-la consigo nesse avanço progressivo”… para a tal “civilização moderna”.
Quanto aos “quatro quintos”, eram uma massa de inércia sem vontade própria e demasiado pesada para ir “nas correntes”? O caso era que: “Somos um povo sem comunidade de pensar e sentir”, dividido e desequilibrado. Ora, os organismos, individuais ou colectivos, carecem, para se adaptarem e sobreviverem de uma unidade e equilíbrio derivados da “estreita sinergia dos seus elementos” e, “em Portugal, essa sinergia não existe.” Precisamente “aí está o nosso mal-estar.”
O médico avisa: “se o equilíbrio não for restabelecido de maneira que a engrenagem social portuguesa volte a funcionar sinergicamente; se esta ficção de organização não for destruída e substituída por uma organização una e harmónica – a nossa existência como nação, como sociedade autónoma, será efémera”; acabaremos como uma “nação morta, condenada a ser devorada pelo ventre esfíngico e insaciável das nações vivas.”
Nestes artigos para O Norte, Manuel Laranjeira não diz quando é que, na nossa história nacional portuguesa, teria existido um tal “equilíbrio”, que agora deveria ser “restabelecido”. Mas terminava, no dia 31 de Dezembro de 1907, com uma nota de esperança: “Eu creio que sim, que isto se pode salvar ainda…”
Veremos como; mas, antes da terapêutica, ainda algumas patogénicas complicações.
1 Comments:
A NOSSA PESTE
A carta publicada na SEARA NOVA é enviada de Kobe, Japão, onde Wenceslau de Moraes vivia, a seu amigo Lopes de Mendonça, e tem data de Maio… de 1911.
A nossa tragédia de existir como nação já era então evidente aos espíritos mais lúcidos.
Diz assim a carta:
Mas de todos os agonizantes é a nação portuguesa a que mais agoniza Porquê? Sejamos francos: povo sem princípios honestos, formado pela aventura e continuando sempre na aventura; muito arrojado, mas seguindo sempre uma moral de rapina; as conquistas,os enormes lucros ganhos sem trabalho, depois as colónias. Tudo isto tem sido a nossa peste. Ilustração nenhuma, cultura nenhuma, ideal nenhum, e sobre isso a enormíssima pressão dissolvente do fanatismo religioso. Ajunte-se a fatalidade do clima. Que pode fazer de bom uma nação que tem vivido nestas circunstâncias? Nada.
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