terça-feira, abril 04, 2006

O faro de um presidente


Sempre que ouço falar em Conselho de Estado, lembro-me de um conto de Gogol, "O Nariz", em que um militar, membro deste órgão político, perde a dita saliência facial. (Vi há alguns anos uma récita da ópera homónima de Shostakovich no CCB. Apesar de gostar muito de várias peças do compositor russo, tenho de admitir que me faltavam os conhecimentos para me deslumbrar com esta ópera; mas achei-a curiosa.)
O protagonista do conto não tinha nariz; Cavaco não tem faro para o cargo que ocupa. Na escolha dos membros que integrarão o Conselho de Estado, Cavaco quebrou a boa prática dos seus antecessores mais próximos de nomear para este órgão representantes das principais forças políticas do país. (Recordo que nem o PCP nem o Bloco têm lá representantes.) Mas esse mal não vem só. Cavaco decidiu nomear amigos e colaboradores directos. O mal está em que a coisa cheira mesmo a "jobs for the boys" e a paga de favores: arranjaram-se tachos para Dias Loureiro, para Ferreira Leite e para o Prof. Lobo Antunes, neste último caso, para pagar o favor de ter sido seu mandatário. Uns poderão dizer que o homem quer estar rodeado por aqueles que melhor o podem aconselhar. Sim, mas esses podia ele sempre ouvir particularmente; não necessitava de os sentar no Conselho de Estado. Ter as várias sensibilidades representadas neste órgão não só transmitiria o sinal de que o Presidente era democrático e sabia ouvir todos nas grandes decisões a tomar como também lhe permitiria, depois, co-responsabilizar, em parte, as diferentes forças políticas por essas decisões.
O Sr. Presidente parece não ter mesmo faro para estas coisas.

4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

a ver vamos de futuro se a confiança a ter nas nomeações do Senhor Presidente , só esperamos que ele olhe para a frente e faça valer o seu saber de Finanças neste País , o que para já dúvido visto que foi preciso mais massa na presidencia , mas , o que eu acho mais mal é o Minist,Defesa estar a subsidiar a Fundação Oriente , essa é a pior .

1:53 da tarde  
Blogger Alexandre Dias Pinto said...

Concordo a 100% com a frase final. Isto de o Estado dar dinheiro para as fundações é inacreditável: Fundação Oriente, Fund. Mário Soares, etc. São os amigos a dividir entre si o carcanhol.

7:45 da tarde  
Blogger Xor Z said...

Caro Alexandre
Não existe, penso eu, nenhuma obrigatoriedade na representação de todos os quadrantes políticos, melhor de todos as facções parlamentares, no Conselho de Estado. Sim eu sei que Sampaio o fazia e acho, embora sujeito a melhor opinião, que era já prática antes dele. Mas a regra democrática devia ser essa (ouço-o já a exclamar), é verdade, mas nunca ninguém disse que o homem que nunca se enganava e raramente tinha dúvidas (ou era ao contrário?) encarnava a pele (veja que já não falo no conteúdo) dum democrata.
Cumprimentos

12:28 da manhã  
Blogger Alexandre Dias Pinto said...

Bem em cheio, Xor Z. É mesmo isso

10:57 da manhã  

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