A lealdade como um princípio prático orientador da reforma do estado?
Para além de existir, hoje, na sociedade portuguesa uma “claustrofobia” política, forma-se, pouco a pouco, uma estrutura de fiéis servidores da vontade do chefe ou aquilo que essa gente pensa ser a vontade do chefe. Na verdade, alguns acontecimentos recentes demonstram claramente que existe uma acomodação nova na estrutura do estado. Esta mudança acabará por se efectivar quando for implementada a nova avaliação dos seus funcionários. Iremos assistir, muito em breve, a excessos de zelo que se converterão em promoções por mérito. Ora, foi na base deste princípio do fiel servidor que se formaram as maiores ditaduras europeias, o nazismo, o fascismo e o salazarismo. Curiosamente, tem vindo a lume, em artigos de opinião ou em discursos de certos políticos, um conceito que constitui o ponto nodal desta ideologia do fiel servidor - a lealdade (por exemplo, o caso da DREN).
A partir deste conceito positivo, pretende-se legitimar posições perversas. Em breve, iremos assistir a uma mudança de universo deste conceito, isto é, o carácter moral perder-se-á e passará a ter uma conotação formal/institucional. Assim, por exemplo, o delator agirá não por moralidade, mas porque se o não fizer, sofrerá também ele a penalização dessa omissão. Quando membros de uma junta médica do estado, numa atitude de fieis servidores ordenam, de acordo com a vontade política dos seus superiores, que uma trabalhadora cancerosa em estado terminal seja obrigada a regressar ao seu trabalho, violando o juramento médico e os direitos fundamentais do homem, colocando a lealdade política de fiel servidor acima das suas obrigações deontológicas, não estarão também eles a converter os excessos de zelo em promoções por mérito? É interessante verificar que a prática dos fiéis servidores são indicadores do sentido daquilo que, alguns, com razão, chamam a reforma do estado. Nós, no entanto, preferimos chamar “golpe de estado”.
PS: depois de ter escrito este post, a comunicação social informou-nos que a responsável pelo centro de saúde de Viera do Minho, Dr. Celeste Cardoso, foi demitida por não ter mandado arrancar um cartaz “jocoso” sobre o Ministro da Saúde. O Ministério da Saúde informou que aquela funcionária superior tinha violado o “direito de lealdade”.