domingo, abril 30, 2006

"Nuclear? Não, obrigado!" (Revisited)











Retomo a frase que se repetia nos anos setenta quando se protestava contra a construção de centrais nucleares. Mas o argumento hoje apresenta alguns cambiantes em relação aos usados há trinta anos atrás. Até porque a História nos fez compreender algumas coisas.
Andam para aí uns senhores empresários com vontade de construír centrais nucleares para "ganhar umas c'roas". (É para eles "ganharem umas c'roas", não para o país prosperar economicamente.) E até já compraram alguns Professores do Técnico para dizer que a solução nuclear representa risco zero e que faz bem ao ambiente. Ora, o encerramento da Central de Guadalajara, em Espanha, oferece-nos uma reflexão pertinente sobre o problema. Parar os reactores e "fechar" a central é um processo que demora nove anos e que traz custos na ordem das centenas de milhões de euros!!! Entre nós, não seria o empresário nuclear Patrick Monteiro de Barros, que se propõe construir uma central de energia atómica, a pagar essa conta quando ela tiver de ser paga.
A minha outra preocupação vai para a chamada "informalidade" portuguesa. Estou certo de que temos óptimos engenheiros para projectar uma central atómica. Mas não estou igualmente seguro de que a sua construção seria levada a cabo sem falhas nem de que a sua operacionalização fosse conduzida sem problemas. É que nós já conhecemos o espírito do "desenrascanso tuga". E a energia nuclear não perdoa as despreocupações, as informalidades e a falta de profissionalismo lusitanos.

sábado, abril 29, 2006

Esta coisa dos deputados não me descola dos miolos

Será possível neste rectângulo à beira mar plantado a introdução do mandato imperativo em círculos nominais. Nesse caso, os eleitos que primassem pela ausência na Câmara ou não cumprissem as promessas que iam de encontro aos verdadeiros anseios das populações, por exemplo, podiam ser destituídos pelos seus próprios eleitores e substituídos por outros mais assíduos e preocupados.
Trata-se duma mera sugestão que, de certeza absoluta, não terá muita aceitação lá por aqueles lados onde pululavam os monges de S. Bento.

terça-feira, abril 25, 2006

Saudações de Abril



"Tudo se levanta como um cravo"

Herberto Helder, Poemacto, 1961

sábado, abril 22, 2006

O ideal dum mundo sem comentários

Acabei de ler uma longa tirada verrinosa da autoria do ilustre JPP, esta peça retórica que mistura o unabomber, assassinos de crianças de 10 anos e comentadores neteiros ou blogueiros foi publicada no Abrupto (onde a li) e no Público. Fiz este enorme esforço impulsionado por uma referência ao assunto do blog Grande Loja do Queijo Limiano. Manda a minha longa tradição de comentador (apenas sou incapaz de glosar golfe, ténis, corridas de caricas e o jogo do botão) proferir algumas palavras sobre este assunto.
Desde logo percebi que o Abrupto não possui caixa de comentários, tal facto leva-me a pensar que o preclaro andará a ver as caixas de comentários de outros blogs, porque se não como teria conhecimento directo daquilo que afirma? Já agora, qual foi o critério de selecção? Obedeceu a normas científicas ou foi um mero controlo de qualidade?
Não quero fazer de “advogado do diabo” e até concedo que existem comentários irritantes e despropositados mas, desde sempre, me pareceu apropriada a indiferença para esse tipo de atitudes. Por outro lado, se eles são assim tão maus, o que não é líquido, antes pelo contrário, por aquilo que vi incitado pela curiosidade, porquê publicitá-los?
Devo também confessar que nunca me tinha deparado nas minhas horas baldias, até instantes atrás, com nenhum dos comentadores, nem pelos pseudónimos nem pessoalmente e, devo dizê-lo com frontalidade, eu próprio uso um pseudónimo que apareceu como uma brincadeira em relação aos escribas do blogcafé (todos Misters, como na célebre rábula) nos meus tempos de iniciação.
O que não posso deixar de notar, por uma emergência ética, é o comentário maldoso que profere a propósito de grande parte desta gente fazer as suas observações no emprego, isto, principalmente, quando se fala tanto das faltas dos deputados. Ontem, num debate com representantes partidários, fiquei a saber que trabalham muito em casa e fiquei bastante mais descansado.
Por último, qualificá-los da forma que o faz não me parece próprio nem adequado nem cordial e quer-me parecer que o caro comentador (quase me esquecia que, afinal, você também era comentador) político quer restringir a net aquilo que pensa que deve ser.
Uma sugestão final, pelo seu processo será possível abafar a música pimba, a má literatura, pintura, escultura, etc. Deixo umas reticências que, pelo andamento da carruagem, são à borla.

quarta-feira, abril 19, 2006

E, agora, algo completamente diferente

Do mesmo autor lisboeta e da mesma obra atrás referida extraímos o Aviso às pessoas incautas que, é apenas uma sugestão sujeita à aprovação dos condóminos, podia, no todo ou em parte, aparecer inscrita no frontispício desta baiuca.
“Esta novela contém adultérios, homicídios, missionários e outros cirros sociais.
Almas, em flor de inocência e candura, não leiam isto que treslaca podridão de gafaria, em que forçadamente a leitora, afeita ao ar puro das regiões vizinhas do céu, há-de sentir nausear-se-lhe a alma.
Nalgumas quintas do Minho, ameaçadas de ladrões, erguem-se uns postes [vejam como se quadra] que dizem: ‘Aqui há ratoeiras’. Os ladrões, graças à instrução, lêem e passam.
Neste livro inverte-se o estilo: os salteadores da pudicícia levantam bem alto o letreiro que diz: ‘Aqui há ladrões’.
Sem o qual letreiro, este livro seria um abismo.”

Momento histórico-literário

Camilo Castelo Branco, epígrafe a Mistérios de Fafe, Romance Social
"O dilúvio, que afogou a Europa no ano 2000, foi necessário e providencial: tanta era a corrupção daqueles povos!" Um filósofo asiático, que há-de escrever no ano 3521.

terça-feira, abril 18, 2006

Se os podemos dispensar uns dias...

Como é do conhecimento geral os deputados, com o seu afã usual, fecharam a tasca na quarta-feira e decidiram ir “laurear a pevide”. É verdade que estamos na época pascal e todos têm direito a umas pequenas férias, mas a tolerância para a função pública não começava apenas depois do almoço de quinta-feira?
Certamente, dentre os oito leitores que lêem estes meus desabafos um, mais perspicaz ou mais atento, já terá meditado que a função legislativa ficou suspensa durante quatro dias (assumo que na segunda-feira já se encontrem no seu posto, o que não é líquido, nem procurei averiguar), uma verdadeira eternidade para uma função nuclear neste país.
Esta situação faz-me vir à memória a “expedição” que, uns anos a esta parte, fiz ao hemiciclo (chamo-lhe expedição porque isto é o mesmo que ir ver a bicharada a África). Ora bem, nesta visita o que se me deparou foi representantes da nação que entravam no Parlamento assinavam um livro (de presenças, suponho) e se punham na alheta, enquanto outros faziam todo o tipo de actividades (falar, ler, rir, etc.) durante um discurso dum seu colega acerca de (bem, não me lembro já qual era o assunto) em claro desrespeito por outros colegas de profissão (profissão aqui é verdadeiramente um mero eufemismo).
Por fim, faço votos que as deslocações “à santa terrinha” destes representantes das províncias (província, o que é isso?) não sejam asseguradas à conta das “famigeradas” ajudas de custo que é o mesmo que dizer, de todos nós.

domingo, abril 16, 2006

Yo no creo en el destino, pero que lo hay...


Transcrevo esta (suposta) lenda persa em espanhol porque foi neste idioma qie a li. Além disso, "la lengua española me encanta."


LAUDA DE ENTRADA

«Un jardinero persa, muy joven, suplicó a su príncipe:
–Encontré a la Muerte esta mañana.
Me hizo un gesto de amenaza. ¡Salvadme! Quisiera, por
milagro, encontrarme en Ispahan esta tarde.
El generoso señor le proporcionó sus mejores caballos. En
la tarde, el príncipe encuentra a la Muerte
–¿Por qué –le pregunta– hizo esta mañana ese gesto de
amenaza a mi jardinero?
–No le hice un gesto de amenaza –responde la Muerte–,
sino de sorpresa. Porque lo veía lejos de Ispahan esta
mañana y debía llevármelo en Ispahan esta tarde».

(Leyenda persa resucitada por Cocteau)

(A fotografia é da Mesquita de Ispahan.)

sábado, abril 15, 2006

"Operação Patanisca"

No Expresso de hoje, Inês Pedrosa chama a nossa atenção para a dimensão xenófoba que envolveu a chamada "Operação Oriente", a qual levou os inspectores alimentares a fechar alguns restaurantes chineses e a comunicação social a denunciar a imundice que existia em vários deles. (Creio mesmo que a xenofobia dirigida aos cidadãos de etnia chinesa está a assumir dimensões preocupantes. Dela falarei em breve.) Ora, Inês Pedrosa pergunta, de forma pertinente, quando se fará a "Operação Patanisca", que inspeccionará as cozinhas das tascas portugueses. É que, nessa altura, todos nós vamos ficar com os olhos em bico.

sexta-feira, abril 14, 2006

Reflexão filosófica sobre as faltas dos deputados

Assim não dá!

A Biblioteca Nacional



O segundo parágrafo do romance Possession, de A.S. Byatt, inicia-se com a seguinte frase: “The London Library was Roland’s favourite place”. Não sei bem o que é isso de “lugar preferido”, mas direi que a Biblioteca Nacional é um dos lugares onde mais gosto de estar e um dos que mais me deslumbra. Não pelo edifício em si, mas pela sensação de calma daquele espaço e pelas iguarias intelectuais que me servem à mesa. É formidável sentarmo-nos nas poltronas da sala de leitura, que, estando no centro da cidade, parece encontrar-se “fora do espaço e do tempo”. Foi aí que, na quarta-feira passada, me deslumbrei na leitura da edição de 1618 da Coronica de los Reis de España, de Jaime Bleda, experiência inolvidável.

Outra coisa me fascina também na BN. É que lá encontro amigos, colegas e conhecidos com quem é excelente conversar e com quem aprendo muito. Isso acontece com o Carlos “antropólogo”, a Margarida, o Paulo, o Agostinho e o Luís Augusto Costa Dias, entre outros. Às vezes encontro lá o Gianlucca, outras o Mário, outras ainda a Carina, quando vem do Algarve, ou a Helena, quando está em Portugal.

Há um último aspecto que me faz amar a Biblioteca Nacional. Cerca de um quarto dos funcionários (estimativa minha) são pessoas que têm algum tipo de deficiência (visual, motora, mental, ou outra) e que aí encontraram um espaço onde podem trabalhar e sentir integrados. Sem piedadezinha nem favor nenhum. Uns são jardineiros, outros trabalham na reprografia, outros ainda directamente com os livros. Aquece-me por dentro esta mobilização de indivíduos a quem são confiadas as tarefas que sabem e podem desempenhar. (Não creio que o sector privado empregaria tantos numa mesma instituição.) Esta vocação humanitária e cívica da BN é uma espécie de cereja no topo do bolo.

quarta-feira, abril 12, 2006

O ataque governamental ao tabagismo

Estou 100% de acordo com as medidas de Sócrates de ataque a certas práticas tabágicas do portugueses. Entre elas destaco fumar em lugares fechados.
Mas gostava de ver o governo a ter igual tenacidade noutro tipo de medidas sociais muito necessárias: o desemprego, as desigualdades, a discriminação dos chineses. Proponho já um slogan para colocar à porta das fábricas falidas ou em risco de falência:
O desemprego prejudica seriamente a sua saúde!
.

Aprés Jenny Holzer



O "truísmo" da imagem é de Jenny Holzer. Agora o meu truísmo:


Being heartbroken can seriously damage your health.

terça-feira, abril 11, 2006

Sic transit gloria mundi ou, em tradução libérrima, Quem não come passa fome

Causou-me ampla estupefacção a notícia, difundida por uma televisão que me escapa, neste momento, a designação, de que o facto de um maior número de portugueses procurar, nestas férias pascais, destinos exóticos era sinal duma retoma económica.
Nesta ordem de ideias, sabendo que a venda de carros de luxo, nestes anos de crise, não tem diminuído no nosso país e o aumento das grandes fortunas tem sido mais elevada que a média europeia, temos que, nesta terra de brandos costumes, nunca houve crise económica nenhuma.
Melhor, aqueles pindéricos que falam de crise não passam disso mesmo: pindéricos. A propósito desta reflexão vem-me à mente o post de Vitoriano Rosa que trata dos lucros “absurdos” das instituições bancárias, leram?
Já agora uma última questão, ainda alguém se lembra das facturas falsas das viagens dos deputados? Não me recorda, agora, se os destinos eram ou não exóticos.

segunda-feira, abril 10, 2006

É possível fazer o capitalismo recuar!

Acabo de ouvir que o governo francês vai retirar a proposta do CPE. É uma vitória da humanidade e do cidadão sobre o capitalismo que o devora e sobre os aliados deste sistema económico, entre os quais estão os políticos neoliberais. Mesmo que se trate de uma manobra do governo francês para voltar a avançar com uma proposta equivalente, o recuo a que assistimos agora tem um valor exemplar e dá-nos esperança na luta por um mundo mais justo e melhor.
Neste momento apetece-me dizer: Je suis un etudiant français.

domingo, abril 09, 2006

O seguro morreu... há muito.



Social Security

No one is safe. The streets are unsafe.
Even in the safety zones, it's not safe.
Even safe sex is not safe.
Even things you lock in a safe
are not safe. Never deposit anything
in a safety deposit box, because it
won't be safe there. Nobody is safe
at home during baseball games anymore.

At night I go around in the dark
locking everything, returning
a few minutes later
to make sure I locked
everything. It's not safe here.
It's not safe and they know it.
People get hurt using safety pins.

It was not always this way.
Long ago, everyone felt safe. Aristotle
never felt danger. Herodotus felt danger
only when Xerxes was around. Young women
were afraid of wingéd dragons, but felt
relaxed otherwise. Timotheus, however,
was terrified of storms until he played
one on the flute. After that, everyone
was more afraid of him than of the violent
west wind, which was fine with Timotheus.
Euclid, full of music himself, believed only
that there was safety in numbers.

Terence Winch

Se o poeta tem referido a falta de segurança que sentimos em relação ao futuro e ao problema de haver ou não dinheiro para a nossa reforma, mandava o poem ao PM.

A fotografia é da obra Safety pin, do Claes Oldenburg dos grandes objectos. (A propósito de alfinetes, que será feito da trindade do Alfinete d'Ama, que anda desaparecida em combate? ... em combate ou a mudar fraldas.)

Do Catolicismo como atentado à ecologia

Já viram isto do Domingo de Ramos? Cada católico no seu movimento dominical em rebanho para dentro da Igreja (sim, os católicos só o são uma hora por semana - quando estão fechados numa Igreja e não podem praticar as suas incoerências e contradições) levam, neste fim-de-semana dos ramos, hastes da nossa flora para o templo. Vi uns a passar com raminhos, outros com ramões; vi outros ainda a comprar ramos à porta de uma Igreja (Oh, a mercantilização do sagrado!). Raminhos para aqui, ramões para ali. No fim, concluí que este é o fim de semana mais anti-ecológico do ano e que a Igreja promove o terrorismo ambiental.

sábado, abril 08, 2006

Custos da Democracia

Encontramos na Visão da semana corrente a notícia (peço perdão pela minha inabilidade em fazer as ligações para as edições on-line) de que os partidos políticos irão receber, até 2009, 64 milhões de euricos (segundo os números do periódico cada cidadão contribuirá com 2,7 euricos). Contas por alto 20 milhões por ano.
Como cidadão comum esta notícia faz-me reflectir sobre a utilidade, do governo público (embora se trate aqui duma contradição entre estes dois termos), em financiar partidos políticos quando o desinvestimento nas áreas nucleares da saúde e do ensino público, entre outros, têm sido uma prática corrente. Deste modo, porque é que os partidos não se autofinanciam?
Abro um novo parágrafo porque já estou a ouvir segredar a alguém que, dessa forma, os partidos políticos ficariam à mercê dos jogos de influência dos lobbies e dos diferentes interesses económicos. Respondo na minha: mais do que já estão?
A despeito de tudo isso, compreendo que é um risco enorme a coisa pública não financiar os partidos. Mas precisam de receber mensalmente, ainda segundo aquilo que o semanário apresenta, 599.625,61 € (PS), 383.005,46 € (PSD), 100.367,96 € (PCP), 96.469,47 € (CDS) e 84.537,25 € (BE)? Não poderiam emagrecer os montantes, à imagem do funcionalismo do estado que, imagino, não nos deve levar tanto dinheiro cada 30 dias, e dar o remanescente aos hospitais e não os tornar SA? Ou ao ensino público em vez de estarem a miná-lo? Certamente que sim, é a única resposta que me ocorre.

sexta-feira, abril 07, 2006

O Novo Escriba do Tonel de Diógenes

Convidámos uma pessoa muito especial para integrar o grupo de escribas deste blogue. Trata-se de Vitoriano Rosa, escritor, jornalista, crítico de cinema, cineclubista, algarvio, anti-fascista (duas vezes preso pela PIDE) e sonhador profissional. Entre os seus livros contam-se O Moderno Cinema Italiano (Ed. Autor, 1953), Dossier Pide (Agência Portuguesa de Revistas, 1974), As Mentiras de Marcelo Caetano (AGP, 1975), João Vargas, um Democrata (ed.) (Civis, 2005). Dirigiu a Agência Portuguesa de Revistas e fundou a revista Cinema 15 e o Correio da Manhã (num formato que não era o que este pasquim tem hoje).
Vitoriano Rosa traz para este blogue os conhecimentos, o humor, as memórias e o espírito crítico dos seus 74 anos muito activos. Não sei se é o blogger com mais idade da blogosfera nacional, mas revelar-se-á certamente um dos mais acutilantes.

Humor digital


Há um blogue GENIAL pela natureza dos seus posts e na forma como constrói sentidos e situações hilariantes a partir da palma de uma mão. Intitula-se Foram-se os anéis e é brilhante na expressividade que consegue obter na antropomorfização dos dedos. Mais não digo, mas aconselho uma visita.
(O cartoon aqui reproduzido foi lá roubado e tem copyright. Vou fazer como o Pacheco Pereira e dizer que é apenas para fins promocionais.)

Fenomenologia blogueira

Existem certamente várias razões que fazem com que proliferem os blogues neste jardim (ou inferno, como queria Almada) à beira mar plantado. Uma das justificações, talvez a mais corriqueira, prende-se com o narcisismo próprio de cada escriba ou melhor, como vimos no blogcafé, dos “administradores” dos sítios que, autocratas em ponto minúsculo armados de uma prepotência feroz e arrogante, fazem e desfazem o trabalho dos outros. Este sentimento de poder, entre outros, que se enraíza no ego é, certamente, um poderoso catalizador desta profusão de ciber-escritores e ajuda a explicar uma série completa de fenómenos.
Um outro factor a ter em conta é a auto-estima. Escrever a sua laracha, o seu poemazinho (sem desprimor pelos ditos cujos que em alguns casos atingem níveis acima da mediania), a sua estória ou comentário a factos políticos, económicos ou sociais aumenta, por assim dizer, a alegria de viver e produz o jogo de espelho e sedução, que não tem necessariamente de ser erótica mas a maior parte das vezes o é, entre emissor e receptor e vice-versa.
Nesta ordem de ideias, tenha-se em conta a fenomenologia sociológica do condutor, enraizado na ideia de que “o meu carro é o meu castelo”. O blog é também a fortaleza onde o castelão se sente seguro da sua força e energia e na qual os efeitos penalizadores são sempre de carácter minimalista e as recompensas, ou reforços na linguagem skinneriana, podem ser múltiplas e variadas.
Depois, existem os blogues com funções específicas, dos quais destaco apenas, porque o meu conhecimento é muito limitado nesta matéria, os de engate que Porcelana Azul, segundo a tradução do Alexandre que é especialista na língua de Edmund Burke (curvo-me perante a sua ciência), no blog Sociedade Anónima, com a sua acutilância natural, espero que não seja artificial e se mantenha por muitos e bons anos, tão bem caracterizou.

Ensaio sobre a cegueira


Ouvi esta manhã, na TSF, uma denúncia da organização Médicos do Mundo, que tem tanto de revoltante como de sintomático dos tempos que correm. A principal vocação desta ONG é enviar médicos em missão para países desfavorecidos. Segundo a informação que ouvi, os médicos vão em regime de voluntariado, não remunerado, o que em si já é muito injusto. (Os países desenvolvidos não admitem que são co-responsáveis, ou muito responsáveis, pelo empobrecimento do terceiro mndo e que ajudá-lo é um gesto humanitário.) Mas o mais grave da situação dos médicos voluntários reside no facto de estes serem profissionalmente perjudicadas por se terem ausentado em trabalho altruísta.
Na página dos Médicos do Mundo encontra-se uma petição que procura alertar os governantes para esta situação.

quinta-feira, abril 06, 2006

Pegada ecológica


Este mapa representa, comparativamente, a pegada ecológica de cada país. A pegada ecológica é, grosso modo, o índice que mede a utilização (e a destruição) que os cidadãos de um Estado fazem dos recursos naturais desse Estado (mar, solo, ambiente, etc.). Portugal é um dos países que não trata bem o ambiente.
Pode calcular a sua pegada ecológica individual aqui.

Fomento Industrial

Mais uma vez atento às notícias que correm nos nossos periódicos venho, por este meio, chamar a atenção para o que o Público notifica na edição de 2 de Abril de 2006. O título da peça é “Calçado resiste à concorrência asiática”, querendo dizer por este asiático, assumo eu, chineses e coreanos.
O que é verdade é que ninguém ainda se apercebeu do elevado alcance estratégico deste informe num país que, como já alertei, poderá ter de viver com 66,6% (número diabólico como alguém anónimo me alertou) do PIB.
Tendo em atenção esta informação alerto a comunidade industrial portuguesa (pequenas, média e grandes empresas) para a seguinte recomendação: calçamos uns chinelos ou umas alpergatas nas pequenas empresas, uns sapatos, podem ser de luva, para as de dimensão média e umas botas, podem ser alentejanas que além de serem nacionais são resistentes, às grandes empresas e, deste modo, fazemos face a todo o tipo de concorrência amarela. Espero que com esta medida eles finalmente saibam quem manda afinal.
Escusado será dizer que o calçado a usar deve ser todo nacional (não só as botas alentejanas) que, desta forma, damos também uma mãozinha à indústria portuguesa.

Filosofia e Direita

A propósito da política socrática (não daquele que foi cicutado mas do outro que, aos poucos, nos vem cicutando a todos nós) perguntava-me um amigo meu, com aquele tom despreocupado que só as crianças têm, se a direita tinha filosofia. E, em tom brincalhão, prosseguia demandando se a filosofia tinha direita. Devo confessar que as questões me deixaram embatucado e ele se riu do meu embaraço, embora, com o intuito de salvar a situação, lhe atestasse que iria pensar no assunto (devia ter dito, como os políticos, ainda bem que me fazes essa pergunta e aproveitava para acrescentar algumas banalidades para me dar tempo para lhe dar uma resposta ainda que provisória) e quando fosse o caso lhe responderia. Pois, Honório, cá vai o produto dessas cogitações por ti catalizadas.
Começo por te assegurar que a filosofia não tem direita ou esquerda. Quer dizer, se tomarmos como boas as reflexões platónicas (seguidas em grande medida pela maior parte dos pensadores) que certificam que ela se dirige à realidade em si mesma, vai em frente e não oblíqua para lado algum (agradeço que não me perguntem em que consiste essa realidade). Nesse sentido, são os poetas que se encontram três pontos afastados da veracidade e, por esse motivo, são escorraçados da cidade (caro “ombros largos”, devo dizer com frontalidade, que antes devias ter expulso muito mais gente que, por pudor, não refiro nesta ocasião). É verdade que se fala dos hegelianos de esquerda o que denota que também haveria dos ditos de direita mas, como sabem, não se pode confundir a parte com o todo e esta nomenclatura, que entrou na linguagem comum, foi, como se sabe, uma instrumentalização ideológica. Já agora, porque será que se continua a chamar aos socialistas anteriores a Marx utópicos?
Ora bem caro Honório, em relação à filosofia da direita duas questões prévias exigem resolução: qual a sua base filosófica/ideológica e depois de resolvida esta questão, quem ocupa esse espaço. À primeira questão só pode haver uma resposta possível, a base ideológico-filosófica da direita é a doutrina da contra-revolução enunciada por Burke, De Maistre, Bonald, etc. e que no nosso país teve os seguintes representantes: Marquês de Penalva (Fernando Teles da Silva de Caminha e Meneses), José Agostinho de Macedo, Filipe Nery Soares de Avelar, José da Gama e Castro, Faustino José da Madre de Deus, José Acúrsio das Neves, Frei Fortunato de São Boaventura, António Joaquim de Gouveia Pinto, entre outros. Por outro lado, como estas doutrinas se afirmam como reacção à Revolução Francesa daí o facto de alguns teóricos (esquerdistas na sua maioria) classificarem todas as doutrinas de direita como reaccionárias.
Em relação à segunda questão apenas podemos atestar que esse espaço é ocupado pelas doutrinas de extrema-direita. Aliás, foram os integralistas os primeiros a serem sensíveis à questão da base ideológica da direita e, por essa razão, foram colher aos tradicionalistas e contra-revolucionários nacionais enunciados as bases da sua doutrina. Se se quiser ter uma perspectiva da construção desta doutrina contra-revolucionária portuguesa leiam-se, entre outros (embora estes me pareçam os mais representativos), os artigos que, debaixo do título Os Mestres da Contra-Revolução, António Sardinha escreveu nas páginas da Nação Portuguesa, revista publicada no início do século XX.
Conclui-se, portanto, daqui que a direita conservadora, asséptica não tem qualquer base doutrinal e nunca possuiu nenhuma. E que melhor exemplo se pode dar que o do seu pretenso líder, o agora Presidente da República, Cavaco Silva.

quarta-feira, abril 05, 2006

A beleza da palavra escrita



Transcrevo outro excerto de O Livro de Cabeceira:

[151] Things That Look Commonplace but That BecomeImpressive When Written in Chinese Characters:
Strawberries.
A dew-plant.
A prickly water-lily.
A walnut.
A Doctor of Literature.
A Provisional Senior Steward in the Office of the Empress's Household.
Red myrtle.
Knotweed is a particularly striking example, since it is written with the characters for 'tiger's stick'. From the look of a tiger's face one would imagine that he could do without a stick.

Copy, right?

É minha impressão ou Pacheco Pereira desrespeitou a lei dos direitos de autor ao reproduzir um excerto do último livro de Agustina sobre D. Afonso Henriques? Leia-se o que está escrito no final da transcrição: "© Guerra &Paz editores, Agustina Bessa-Luís. Reprodução Interdita".

O ovo ou a galinha

- O Senhor Director está demitido.
- Desculpe, Sr. Ministro. Antes de o Senhor me demitir, eu apresento a minha demissão.

(O título do diálogo foi-me sugerido por uma amiga.)

terça-feira, abril 04, 2006

O faro de um presidente


Sempre que ouço falar em Conselho de Estado, lembro-me de um conto de Gogol, "O Nariz", em que um militar, membro deste órgão político, perde a dita saliência facial. (Vi há alguns anos uma récita da ópera homónima de Shostakovich no CCB. Apesar de gostar muito de várias peças do compositor russo, tenho de admitir que me faltavam os conhecimentos para me deslumbrar com esta ópera; mas achei-a curiosa.)
O protagonista do conto não tinha nariz; Cavaco não tem faro para o cargo que ocupa. Na escolha dos membros que integrarão o Conselho de Estado, Cavaco quebrou a boa prática dos seus antecessores mais próximos de nomear para este órgão representantes das principais forças políticas do país. (Recordo que nem o PCP nem o Bloco têm lá representantes.) Mas esse mal não vem só. Cavaco decidiu nomear amigos e colaboradores directos. O mal está em que a coisa cheira mesmo a "jobs for the boys" e a paga de favores: arranjaram-se tachos para Dias Loureiro, para Ferreira Leite e para o Prof. Lobo Antunes, neste último caso, para pagar o favor de ter sido seu mandatário. Uns poderão dizer que o homem quer estar rodeado por aqueles que melhor o podem aconselhar. Sim, mas esses podia ele sempre ouvir particularmente; não necessitava de os sentar no Conselho de Estado. Ter as várias sensibilidades representadas neste órgão não só transmitiria o sinal de que o Presidente era democrático e sabia ouvir todos nas grandes decisões a tomar como também lhe permitiria, depois, co-responsabilizar, em parte, as diferentes forças políticas por essas decisões.
O Sr. Presidente parece não ter mesmo faro para estas coisas.

'O Livro de Cabeceira'


O Livro de Cabeceira (Makura no Soshi) é uma obra escrita no Japão medieval, no final do século X, e atribuída a uma dama da corte da Imperatriz Sadako, Sei Shonagon. Trata-se de um abundante conjunto de notas pessoais sobre a vida na corte, glosando temas como o amor, as regras sociais, o bom gosto, os costumes e até a governação. Os vários testemunhos compõem uma imagem panorâmica da vida da corte japonesa daquela época.
Estou a frequentar uma tradução inglesa, que recebe o título de The Pillow Book. (Sim, o mesmo título do filme de Peter Greenaway, que se inspirou no livro.) Transcrevo aqui um excerto famoso sobre bom gosto. Verão que o padrão que aqui se apresenta nada tem a ver com o "bom gosto burguesinho" dos nossos dias. E, ainda assim, tem uma apelo transcultural e trans-histórico que nos conquista. (Espero que a Bomba Inteligente não saiba japonês e não venha corrigir esta tradução.)
A white coat over a violet waistcoast
Duck's eggs
Sherbet ice, liana syrup, in a nice new silver bowl
Rock crystal
Wistaria
Snow on plum blossoms
A pretty little girl eating strawberries

domingo, abril 02, 2006

Por uma "Estória" de Portugal monga e medíocre


O jornal Expresso começou este semana a publicar uma série de livros com CDs nos quais se apresentam às crianças alguns dos reis de Portugal. Comprei o primeiro livro, sobre Afonso Henriques, e pasmei. Os desenhos de André Letria parecem interessantes a vários níveis; a narração de Bárbara Guimarães, nem por isso - mas não é esta que está aqui em causa. A minha análise e a minha avaliação incidem, sobretudo, sobre o texto.
O conteúdo é francamente mau. O texto procura mostrar Afonso Henriques na sua infância e na juventude como um menino e, mais tarde, um jovem igual a tantos outros, mas que se destaca pelo sonho, pela vontade e pelo empenho. Mas a mensagem é pobre e é-nos apresentada de forma medíocre e patética... sem arte. Outro problema é que, se este pretende ser um livro instrutivo, que ensine às crianças (tem de ser às crianças até aos 9 porque é demasiado infantil para se destinar a um público mais velho) alguma coisa sobre a História de Portugal, falha redondamente! Dá-se uma ideia redutora e pateta do que foi o crescimento de Afonso, do papel de Egas Moniz e da sua confrontação com a mãe. O que é mais surpreendente é que o livro termina no momento em que Afonso chega ao trono. Ora, a "obra" do nosso primeiro rei só aí começa. E a dimensão político-militar relevante é completamente ignorada. Conclusão: o livro não funciona como obra didáctica. Surpreende-me muitíssimo que tanta mediocridade seja apadrinhada pela Associação de Professores de História. Finalmente, há as cantigas lorpas, estilo festival da canção, que devem agradar aos seus compositores, mas não às crianças a quem se destinam.
Esta obra increve-se naquela ideia de que os conhecimentos se podem adquirir sempre de forma lúdica e sem esforço. Os mais básicos, talvez; mas só esses. Os mais complexos exigem o nosso empenho e a nossa luta corpo a corpo com os livros que no-los dão.

sábado, abril 01, 2006

Onde para o PIB

Se não se trata duma mentira do Expresso, porque a edição é de 1 de Abril, 1/3 do PIB vai, com o primeiro-ministro (já agora fiquem com ele), abandonar o país. O pretexto para nos roubarem esta porção considerável, penso eu (que agora não me apetece confirmar), é uma ida a Angola.
Temos todos consciência que Angola precisa de alguma ajuda mas levarem-nos assim 33,3% do produto de todo o nosso esforço duma assentada é obra. Quer isto dizer que vamos ter que viver, pelo menos enquanto estão ausentes, com 66,6% dos nossos recursos o que pode conduzir a maior carestia de vida. Foda-se, como se a vida já não estivesse tão cara!
Um outro problema, decerto não despiciente, redunda no facto de, imaginem a catástrofe, essa porção considerável do PIB não voltar mais. Como já temos um dos PIB mais baixos da CEE como será após essa traição, sim porque não tenho outro nome a atribuir-lhe, dessa porção viciosa do PIB. Outras questões seriam também pertinentes mas deixo-as à imaginação de cada um.
Foi, por outro lado, para mim uma surpresa saber que 33,3% do PIB se movimenta em doze membros locomotores que têm o condão de o fazer “laurear a pevide”. Já tinha ouvido falar em “cash flow” (confesso não saber muito bem do que se trata mas parece-me que se desloca) mas isto nunca. Haverá algum maneira de impedir que os 5,qualquer coisa% por cabeça passeiem por onde querem a riqueza do país? Se algum leitor mais atento souber como resolver a situação contacte-nos por e-mail e 9.999.994 cidadãos agradecem.
Será que o cidadão comum que se deslocar ao estrangeiro pode requerer levar, sei lá, 10% do PIB? Ou é um processo muito complicado?