quinta-feira, agosto 31, 2006

Floribela e a questão de classe

O psicanalista Carlos Amaral Dias disse, perspicazmente, há uns tempos que a luta de classes se travava hoje, não no mundo empírico, mas nos media. Embora eu não advogue a luta de classes como solução para os problemas sociais e económicos (o marxismo não dá resposta às questões de hoje; a minha linha é mais a do pós-marxismo revisionista), estou plenamente de acordo com a ideia de CAD.
Um caso interessante em que a questão social se coloca e onde se podia ver uma atitude crítica perante o statu quo social é o da telenovela Floribela. Em primeiro lugar, temos uma protagonista de classe humilde, uma desfavorecida, que se identifica com a sua condição social e se realiza pessoalmente malgré elle. No entanto, como os modelos televisivos são dominantemente classe-média, a personagem tem de, no final, ultrapassar a sua condição social casando com um gajo da classe média-alta. (Já viram que a burguesia nacional confunde a classe média endinheirada com a dita classe alta? Portugal é mesmo provinciano!) Perde-se, assim, uma oportunidade para subverter a apologia da classe média e dos seus modelos num programa de televisão.
Por outro lado, o próprio elenco parecia ter algo de subersivo. O galã não é o tipo bonzão, muita giro, mas um adolescente efeminado e enfezado com rosto de babuíno (perdoe-me o animal). E a própria actriz que faz de Floribela, apreciada pelo prisma burguês, é uma parolita com cara de filha de porteira, com pernas grossas e cabelo "ninho de ratos", uma bimbalhota que fala à "puarto". (Não subscrevo a análise, reproduzo apenas a visão burguesa.)
Tudo feito para termos um novo modelo de actores e de personagens que minasse os modelos burguês e classe-média. E o que temos afinal? As personagens e os actores a servirem as aspirações, os valores e a concepção social da burguesia: a gaiata quer casar com o patrão rico, uma apologia do dinheiro e da superioridade de classe, a família maravilha a que o espectador gostava de pertencer é classe-média endinheirada, a apologia do dinheiro e da "superioridade" de classe, os jovens fenómeno da middle class. Em suma, temos uma reedição requentada da Música no Coração à portuguesa que não tira proveito (nem podia) no potencial subversivo que o elenco e as personagens continham.

terça-feira, agosto 29, 2006

A filosofia é uma doença da alma

A filosofia como actividade reflexiva tem como função complicar aquilo que parece simples. Vejam, por exemplo, uma pessoa que entra numa galeria e começa a olhar para um quadro porque o dia está quente e o espaço tem ar condicionado. Certamente, uma situação simples, corriqueira, do dia a dia, mas, para o filósofo não, aquilo que ali está não é simplesmente um indivíduo a olhar para uma pintura, antes de mais estamos na presença dum sujeito e dum objecto e, o que é mais grave, duma relação estabelecida entre os dois.
Quanto à pintura, a casa não é só uma casa, um telhado, mesmo que chova, é o ventre materno, o porto de abrigo, a segurança e a estabilidade. E o rebanho de ovelhas não é só um aglomerado de produtores de leite e queijo, é o espírito de grupo, a representação simbólica dum tipo de sociedade, a cooperação e, esperem lá, porque está aquela ovelha isolada? Depois de tudo isto, ainda são capazes de implicar, com o ar mais natural do mundo, com a merda das pedras e a floresta que rareia.
Ora bem, se tivermos em atenção que os simples são os bem aventurados, como queria JC, a simplicidade é a condição da felicidade. Deste modo, sendo a felicidade a saúde da alma, proposição com a qual estaremos todos de acordo, a complicação é a sua maleita e os máximos complicadores, isto é, os filósofos, os mais enfermos da alma e, digo-o com profunda pena, impossíveis de vir a tornarem-se sãos.

domingo, agosto 27, 2006

O Maior Monstro do Mundo

Na edição do Expresso deste sábado, João Pereira Coutinho publica um texto (intituldo "Saco cheio") na sua coluna semanal sobre a campanha iniciada pelo governo britânco para combater a obesidade e as doenças associadas a uma má alimentação. JPC é um daqueles liberais de direita (não, não se trata de um pleonasmo) que embirra solenemente com a intervenção do Estado nas várias dimensões da esfera pública. Mesmo que seja (e sobretudo se for) para melhorar a vida dos podiam viver melhor. No presente artigo, JPC acha condenável que o governo de Blair queira incentivar os britânicos a comer de forma mais saudável e a combater o excesso de peso. Para este comentador que passeia semanalmente a presunção e a arrogância na sua coluna, esta intervenção do Estado em assuntos "privados" revela-se sempre abusiva e castradora (castradora dos abusos do sistema económico devia ser...). O jovem analista chega mesmo a comparar esta atitude preventiva do governo britânico à classificação de pecado capital que a Igreja em tempos de intolerância (em que nem se sonhava com o Liberalismo) atribuira à gula.
Ora, o que o tenrinho não nos diz, mas nós sabemos, é que ele próprio é um beatozinho promovido pelo lóbi católico, quiça pela Opus Dei. Por isso quererá ignorar que a sua igrejinha sempre foi muito, muito mais intrometida e autoritária do que o Estado na imposição de preceitos, comportamentos e de formas de pensar dos cidadãos individuais. (Porque não a atacam os liberais e os neoliberais?)
Contudo, a minha principal objecção a tão tacanho argumento é outro. A direita neoliberal embirra com o Estado, odeia o Estado, queria ver o Estado retalhado e vendido aos privados (A Sonae comprava os tribunais, o Amorim a Polícia, a Al-aqaeda o Ministério da Defesa). Então mas será que não dá jeito à classe económica dominante que exista um Estado que promova a ordem pública, proteja os interesses desta classe e lhe conceda chorudas regalias (que é o que acontece)? O Estado é assim tão maroto? Ou será que os (neo)liberais cospem na sopa que os alimenta?
Para quem nasce com o cu virado para a lua e apenas se preocupa com o seu umbigo (como é o caso do petulantezinho JCP), as desigualdades, as injustiças sociais, o sofrimento dos desfavorecidos não chegam a ser problemas porque existem fora da redoma de vidro em que este grupo de pessoas vive. Nos casos em que se trata de bater o pé aos poderes hegemónicos do país, só nesses casos, o Estado torna-se o Maior Monstro do Mundo.

Caso Mateus

Não, não, caros leitores, não vou falar mais daquele livro que foi o assunto das duas últimas coisas postadas. Mas sim falar do célebre Caso Mateus que, devo dizer à puridade, não sei em que consiste, só sei que envolve clubes de futebol e o futebol, como sabem, é o único motor das manifestações populares neste rectângulo ocidental.
A despeito de tudo o que se tem dito de Belenenses, Gil Vicente e Leixões soube, por via bem informada e fidedigna, que brevemente teremos um Caso Lucas, a que se seguirá um Caso Marcos e que será rematado (esta expressão fica sempre bem quando se fala do pontapé na bola) por um Caso João.
Esperamos em breve fornecer mais pormenores.

sábado, agosto 26, 2006

Estamos numa faculdade, minha senhora

O livro anteriormente citado, que convém esclarecer se trata duma tese de doutoramento, não pára de me surpreender. Neste caso a admiração provém do facto de, a propósito da figura de Antero de Quental, a autora citar um livro dirigido a alunos do décimo segundo ano (os mais atentos já terão adivinhado que sobre a obra do autor açoriano Tendências gerais da filosofia na segunda metade do século XIX).
É necessário tornar claro que nada me move contra os autores de manuais escolares de filosofia do secundário, como é óbvio, e não se trata de pôr em causa a validade científica desta obra ou de qualquer outra, é apenas uma questão de níveis de aprendizagem e a faculdade é o nível a seguir ao secundário, como este é o grau que se frequenta depois do básico.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Se é possível que Kant conte, é também provável que Comte cante

Pensei eu que ao longo do carro de anos que já levo não haveria coisa alguma que me surpreendesse, ingenuidade minha dirão vocês, e me levasse a escrever meia dúzia de linhas sobre o assunto.
Pois aqui me encontro porque li numa obra recentemente editada que Kant era positivista, apud Maria Clara Calheiros, A Filosofia Jurídico-política do krausismo português, Lisboa, INCM, 2006, nota 125 da p. 185.
Neste pedaço de arte ficamos também a saber que das obras de Sanz del Rio “resultam claras as ideias teístas e deístas e um certo misticismo”, p. 85. Deísmo e teísmo ao mesmo tempo e no mesmo lugar é violação da lei da não contradição do estagirita (lá vai o Alexandre dar-me nas orelhas, outra vez, por causa do filósofo grego. E eu a dar-lhe e a burra a andar).
Por outro lado, considera que a seidade é uma das categorias fundamentais compreendidas na análise do eu, vd. p. 52. Seidade? Que raio será a seidade? Será que algum leitor caridoso (não lhe chamo pio porque segundo Frei Lucas de Santa Catarina - Prólogo do Serão Político, Lisboa, 1723 - pode ser testemunho), me poderá ajudar enviando-me, via comentário ou mail, o significado deste termo que não aparece nos principais dicionários de filosofia ou de língua portuguesa.
Vamos ficar por aqui, porque para um só dia já é estupefacção (lá me ia escapar o vocábulo espanto que, segundo o que não se pode nomear, está na origem da filosofia) suficiente.

segunda-feira, agosto 14, 2006

Tal pai, tal filho

Um amigo meu mandou-me este mail provocatório, sendo a minha pessoa propenso ao justo meio aristotélico (cá vai mais uma para irritar o Alexandre que, sabemos todos, detesta o estagirita) não podia deixar de ponderar maduramente antes de lhe dar voz blogsférica.
Significa isto que não foi de ânimo leve que afirmo, e passo a citar:
"Já sabíamos o que os EUA podiam fazer por causa de duas casitas, o que não sabíamos era o que Israel podia fazer por dois soldaditos".
Depois disto podem-me chamar anti-semita, porque anti-estadounidensedaaméricadonorte tenho orgulho de ser.

Olhe que não, olhe que não sr. ministro

Na semana passada o ministro António Costa, com razão ou sem ela, queixava-se da falta de civismo das populações assaltadas pelos fogos. Esta crítica tinha a ver com o facto de não haver áreas de segurança em volta das casas e povoados e, por extensão, de não se fazer, em tempo útil, a limpeza das matas.
Estranhámos esta verborreia tardia do ministro que deve conhecer o célebre provérbio: “em tempo de guerra não se limpam armas”. Mas mais esquisito foi o virmos a saber, a propósito do combate ao fogo e a dificuldade que os bombeiros têm de entrar em certos bosques, que as matas do Estado, a fonte são os próprios chefes das corporações de bombeiros, são as piores nesse aspecto específico da prevenção de incêndios.
Só nos apetece exclamar: vá gozar com quem lhe fez as orelhas sr. Ministro.

domingo, agosto 13, 2006

Is peace really coming?


Enchemo-nos de esperança e de júbilo com o compromisso do cessar-fogo. Mas, nestas coisas, funcionamos como São Tomé.
(Não traduzi o título deste post para português para não perder o trocadilho.)

Marcello por Marcelo


O Expresso desta semana dedica três páginas da revista Única a Marcello Caetano, por ocasião do centésimo aniversário do nascimento do professor e estadista. No primeiro caderno do semanário, o afilhado Marcelo Rebelo de Sousa consagra um artigo de opinião ao segundo (e último) chefe de governo do Estado Novo. E avalia a sua actuação em três planos: enquanto amigo da família Rebelo de Sousa (amizade que se pauta pelo signo do nepotismo), como Professor e como governante. Destaco apenas, com espanto mas não com supresa, que Marcelo Rebelo de Sousa elogie a atitude cívica de Caetano. Atitude cívica de Marcello Caetano? Falamos do tiranete que aceitou continuar a obra de Salazar, que continuou a perseguir e a oprimir e que disfarçou com ares de Primavera o que continuou a ser o "Inverno do nosso descontentamento". Falamos do endoutrinador da Mocidade Portuguesa e co-responsável pela acefalia acrítica da geração dos nossos pais e avós. Atitude cívica? Concordo que temos sempre de reavaliar e de rever a História; mas mascarar os seus podres por amizade e simpatia é intelectualmente desonesto.

sexta-feira, agosto 11, 2006

Quanto vale uma alma muçulmana?

Já fui alertado para o facto da cobertura jornalística sobre o diferendo entre Israel e o Hezbollah (há um jornalista, na Sic Notícias, que diz Hizbollah, será que o homem sabe árabe ou papagueia a fonética da CNN?) tem sido mais ou menos imparcial. Porém, é necessário determinar, em boa justiça, quem é o agressor e o agredido e, nesse caso, deixo ao leitor decidir essa questão de acordo com a sua consciência, convicções e visão do mundo.
Partindo desta imparcialidade putativa, não podia deixar de me ficar no ouvido a notícia dos principais telejornais nacionais que qualificaram como o pior dia do conflito aquele em que seis militares reservistas israelitas foram mortos por um katiuchka hezbolliahno.

Equívocos jornalísticos


Deve ter havido algum erro na escolha da fotografia que ia acompanhar este título. Pensei que a frase "um plano para cometer assassinatos a uma escala inimaginável" se aplicava à acção do exército americano pelo mundo fora. Não me enganei, pois não? O erro está na selecção da imagem, certo?

quinta-feira, agosto 10, 2006

Todas as situações são iguais, mas umas são mais iguais que outras

Devo confessar que não nutro qualquer simpatia pelo preclaro Santana Lopes e que se fosse do meu alvitre nunca tinha posto os butes na cadeira do poder. Devo confessar que os políticos me irritam, em geral, e SL, em particular. Tenho a certeza que se o seu valor como homem público passasse na alfândega nada teria a declarar.

Tenho a convicção que SL pensaria o mesmo que dizem que cogitava Bernardino Machado que asseverava que queria ser presidente de qualquer coisa…nem que fosse duma junta de freguesia.

Este atestado que vai assinado e reconhecido pelo notário serve para relembrar aos mais esquecidos que foi na sequência dum conjunto de incêndios, semelhante aos que temos tido, que se lançou através dos tablóides (não digo jornais nem periódicos porque agora é fino dizer tablóides) uma campanha que levou à demissão do inefável – graças a Deus, exclamámos todos: crentes e agnósticos.

Já aí está tudo a exclamar que outros valores (leia-se barões, do partido dele e dos outros) se conglomeraram e trouxeram à colação o tema. É um facto e cada um tire daqui as inferências que achar por bem.

quarta-feira, agosto 09, 2006

Em apoio a um jornalismo pelas causas humanitárias



Não me lembro de ver capas tão fortes como as que o The Independent tem publicado recentemente. (Esta é de hoje.) Faz-me acreditar que o mundo não é apenas cinismo, egoísmo, capitalismo, neoliberalismo e Realpolitik. Ainda há quem não tenha vergonha de cultivar a empatia pelo factor humano e quem não tenha vergonha de dizer que cada indivíduo conta.
... Porque os seres-humanos não são contabilizáveis em estatísticas!

O arrasador argumento da direita

Num comentário a um post que escrevi sobre a queda dos impérios, profetizando indirectamente o fim da Pax Americana e aludindo à bellum iudicae, um(a) tal Sr.(ª) Iceberg veio congelar a minha argumentação contra o pernicioso domínio da América no mundo (e de Israel no Médio Oriente) com o demolidor comentário: "E pensava eu que V.Exc. iria falar do Império dos Irmãos Castro [...] O seu silencio [sic] sobre o tema é, como diria o outro, verdadeiramente insurdecedor [sic]". Miguel A. resumiu na mesma caixa de comentários a resposta a dar a um disparate destes: a ditadura castrista é tão hedionda e criminosa como qualquer ditadura de direita: "não há ditaduras de esquerda, apenas ditaduras".
Compreendo que os mentecaptos da direita (lá estou eu a incorrer em pleonasmos) necessitem de identificar toda esquerda com os regimes autocráticos (e nada de esquerda) de Stalin e de Castro. A acusação é arrasadora: no fundo, toda a esquerda é despótica e sanguinária. Para a direita é conveniente ignorar que a verdadeira esquerda (e mesmo os comunistas democratas, que ainda existirão, mas não em Portugal) se demarcou há décadas desses regimes. Prefere a direita acreditar que o pensamento progressista não evoluiu depois de Marx. Enganam-se os conservadores mais por vergonha do que por ignorância: custa-lhes aceitar que há quem se bata contra atentados à humanidade como as injustiças sociais, as desigualdades e os vários tipos de opressão.
Volto ao regime "del comandante" para alargar a acusação a outras figuras emblemáticas de uma certa esquerda que têm de ficar fora da galeria dos combatentes democráticos, tais foram os comportamentos despóticos que tiveram e os crimes que cometeram. Refiro-me ao icónico Che, mas também a uma figura lendária da minha adolescência, o anarquista Buenaventura Durruti, cujo quadragésimo aniversário da morte será em Novembro deste ano, mas que, pelas razões apontadas, não transformarei num momento de glorificação do combatente. Che e Durruti tinham ideias de esquerda. Mas quando a mão não acompanha o pensamento, o erro é imperdoável.

domingo, agosto 06, 2006

Eça, Ortigão, a larica e as dietas


Entrei há umas semanas numa dieta alimentar (uso o pleonasmo para não imaginarem que a dieta aqui é metafórica), que tem tido alguns resultados animadores. O pior é que, para um lambão como eu, custa muito, mesmo muito (!), trocar bolinhos por tostas integrais, açorda e bacalhau à Brás por peixe grelhado, álcool por água light, entre outros sacrifícios gastronómicos a que a pós-modernidade ocidental não me habituou. Ora, para distrair esta imolação dos meus prazeres culinários, resolvi pôr-me a ler romances para o intervalo das refeições passar mais depressa. Embarquei no outro dia n'O Mistério da Estrada de Sintra, narrativa composta a duas mãos por Eça de Queirós e por Ramalho Ortigão. Foi pior a emenda que o soneto. É que, na página 76 da minha edição, esbarrei com este excerto:
"Havia sobre a mesa um pão, uma caixa de sardinhas de Nantes, uma terrinazinha de fois gras, uma perdiz, uma fatia de queijo e três garrafas de vinho de Borgonha [...] Atirei rapidamente com os pés para o chão. Sentei-me no sofá, senti a fome a encavalar-se-me no dorso, carregar-me na cabeça para cima da ceia, cingir-me a cintura com as suas pernas esgalgadas e cravar-me no estômago vazio os acicates da gula." [Como te entendo, narrador, mon semblable. As vezes que isso me ocorre ao dia...]

(Na foto vemos Eça e Ortigão.)

sábado, agosto 05, 2006

sexta-feira, agosto 04, 2006

Os impérios não duram até ao fim dos tempos


Os impérios de hoje, como os de ontem, não durarão até ao fim dos tempos e não virão a assistir ao (nem a contribuir para) fim da história. Transcrevo aqui o famoso poema de Shelley, "Ozymandias" (referência ao nome grego do Faraó Ramsés II) sobre a relativa efemeridade dos impérios. É uma lição para os poderes bélicos que hoje exercem a sua hegemonia à escala global.
OZYMANDIAS of EGYPT

I met a traveller from an antique land
Who said:—Two vast and trunkless legs of stone
Stand in the desert. Near them on the sand,
Half sunk, a shatter'd visage lies, whose frown
And wrinkled lip and sneer of cold command
Tell that its sculptor well those passions read
Which yet survive, stamp'd on these lifeless things,
The hand that mock'd them and the heart that fed.
And on the pedestal these words appear:
"My name is Ozymandias, king of kings:
Look on my works, ye mighty, and despair!"
Nothing beside remains: round the decay
Of that colossal wreck, boundless and bare,
The lone and level sands stretch far away.
Ver uma tradução em português do Brasil, de valor muito discutível, aqui e uma recriação em desenhos animados do soneto aqui.

quinta-feira, agosto 03, 2006

Por um jornalismo das GRANDES causas


O The Independent continua a sua linha editorial de defesa das causas humanitárias. Não se trata, neste caso, de um jornalismo de esquerda (embora para os cínicos da Realpolitik e para os indiferentes defender a vida humana, o tratamento justo dos indivíduos ou o respeito pelos outros se enquadre na agenda da esquerda). Na verdade, o jornal promove as causas transversais a todo o espectro ideológico da sociedade (ainda que uns as encarem apenas do ponto de vista teórico ou utópico) - refiro-me àquelas questões que estão, no dizer the Anthony Giddens, Para além da esquerda e da direita (a defesa dos direitos humanos, da igualdade racial e de género, etc.). Trata-se de um jornalismo de intervenção que rompe com as linhas editoriais da indiferença, da promoção de clientelas ou dos interesses ideológicos do Estado.
Só não percebo, nesta primeira página, o anúncio a uma marca alemã de velas de motor de automóvel e de limpa pára-brisas... Piada aparte, agrada-me também a ideia de o jornal pretender aguçar o interesse dos seus leitores pelo saber e pela arte e distribuir reproduções de pinturas do património artístico da humanidade.

quarta-feira, agosto 02, 2006

Descubra as diferenças:



(Destruição no Líbano)

Só há duas formas de perspectivar estas coisas: do ponto do vista das razões de Estado ou do ponto de vista do ser-humano individual e do seu sofrimento. Quanto ao jogo de cintura das diplomacias americana e israelita, serve-nos a famosa frase de von Clausewitz para explicar esta forma de actuação: “a diplomacia é apenas a continuação da guerra por outros meios”.