domingo, setembro 28, 2008

"Coimbra, 28 de Setembro de 1990"

« Escândalos políticos sucessivos, com justificações oficiais vergonhosas. Inquéritos, demissões, prisões, mas tudo a fingir, para oposição ver. A hora é de podridão e desvergonha. E já poucos sentem sequer o cheiro pestilento do ambiente. A sociedade normalizada e climatizada ao sabor dos cabecilhas a exemplificar fidedignamente a nossa decadência. Fabricam-se todos os figurantes da farsa no mesmo molde de subserviência, ganância e hipocrisia. A execrável tirania de há pouco tinha ao menos o mérito de ser frontal, culta e respeitar o inconsciente do povo português. Esta de agora é sorna, analfabeta, e agride e ofende diariamente o que de mais profundo e sagrado há em nós. »

Miguel Torga, Diário, vol XVI.

sexta-feira, setembro 26, 2008

ATAHUALPA YUPANKI

Há 100 anos nasceu na Argentina Hector Roberto Aramburo. Ficou conhecido pelo nome que ainda jovem tomou para si da língua quechua – Atahualpa Yupanki: “O recitador que vem de longes terras”.
O nome era um destino:

Soy un cantor de artes olvidadas
Que camina por el mundo para que nadie olvide lo que es
Inolvidable….

Das longes terras e artes em que os poetas cantavam os seus próprios versos e encantavam a tribo.

quinta-feira, setembro 25, 2008

Barroco, Guercino e Góngora



Acho curiosa esta pintura de Guercino. Não a acho bela. Não tem a delicadeza de um Boucher, nem a sensualidade de certos Fragonards e muito menos a expressividade de um Poussin. A meu ver não tem. Mas o gesto mordaz e paródico que o quadro encerra é subtil.

O motivo da Arcádia era cândido, harmonioso e sereno. A Arcádia, recorde-se, era aquele lugar campestre e idílico onde os pastores e as pastoras tocavam as suas flautas (tocavam as suas flautas?) e se amavam e onde o tempo parecia não passar. Este foi um motivo que muito cativou a Antiguidade greco-latina, depois a estética renascentista e, por fim, o Neoclassicismo.

O que há de subtil e interessante neste quadro de Guercino, pintor Barroco? Ora, o Barroco é a arte do excesso, da intensidade; é a arte que tematiza a morte e a fugacidade da vida. Pois neste quadro, que retoma o motivo da Arcádia (e que se intitula, como outros, Et in Arcadia Ego), os dois pastores espreitam por entre uns troncos e são surpreendidos pela presença da caveira e da morte no seu paraíso idílico. E o que aconteceu à luminosidade e à vegetação ora verde ora dourada pelo sol de outros quadros sobre a Arcádia? São agora cores foscas, "natureza morta", ruínas e ensombramento.

Remato o post com um poema emblemático do mestre dos poetas barrocos espanhóis, Luís Góngora, sobre a acção do tempo sobre o ser humano e, sobretudo, sobre uma mulher bela (maior tragédia não há!):


Mientras por competir con tu cabello,
oro bruñido al sol relumbra en vano;
mientras con menosprecio en medio el llano
mira tu blanca frente el lilio bello;

mientras a cada labio, por cogello,
siguen más ojos que al clavel temprano;
y mientras triunfa con desdén lozano
del luciente cristal tu gentil cuello:

goza cuello, cabello, labio y frente,
antes que lo que fue en tu edad dorad
aoro, lilio, clavel, cristal luciente,

no sólo en plata o vïola troncadas
e vuelva, mas tú y ello juntamente
en tierra, en humo, en polvo, en sombra, en nada.


terça-feira, setembro 23, 2008

A "MORTE DE PORTUGAL" ( I )




Sem temores de desabamento das falésias, aninhadas à beirinha do grande oceano tão convidativo a lançar-nos à aventura do que for e vier – o por vir -, as branquinhas Azenhas do Mar não me parecem o melhor sítio para esmoer águas passadas e turvadas de melancolias. Contudo, talvez por ser confessadamente um “ensaiozinho reflexivo de horas nocturnas”, o ensaísta Miguel Real não se coibiu de assinar daí, a 23 de Setembro de 2007, um texto que intitulou “A Morte de Portugal”, publicado em livro com o mesmo título no mês seguinte por uma editora portuense. O “ensaiozinho” ocupa as primeiras 59 das 115 páginas de texto do livro.

Nele, é seu expresso intento « demonstrar que a constelação cultural e civilizacional por que emergiu a realidade histórica designada “Portugal”, enquadrada em quatro complexos culturais abaixo enunciados, atingiu o seu limite de esgotamento – menos por efeito de um decadentismo político (temos vivido em plena decadência desde D. João III) e mais por causa de um fenómeno de acentuadíssima descristianização e desumanização ética da sociedade e de uma rapidíssima submersão social numa tecnocracia científica anónima que nivela as nações, metamorfoseando-as em regiões singulares de uma futura supranacionalidade europeia, comandada por títeres janotas que transfiguram a nobre arte política numa cinzenta cadeia técnica de raciocínios causais [sic] – e está a chegar ao fim (…). » Aqui temos num estirado parágrafo a tese e todos os motivos para ficarmos sem fôlego. Em nota de pé de página, acrescenta que este “chegar ao fim (… ) em História, não significa desaparecimento; antes uma transformação lenta, prolongada por mais de um século.» Será “lenta”, mas sem excluir no limite a tal “submersão rapidíssima”...

De notar que Miguel Real fala em “quatro complexos culturais”. A cada um deles dedica o autor cada um dos restantes capítulos do livro, e quais sejam eles é o que o leitor interessado ficará a saber se o ler. A tese enunciada supra exprime um sentimento difuso que, nas últimas décadas, outros já ponderaram em termos reflectidos: lembro por todos o notável letrado portuense Amorim de Carvalho e o último livro que nos deixou: O Fim Histórico de Portugal, publicado em 1976. O mesmo ano em que vimos Miguel Torga escrever: « Começo a temer que estejamos no fim da nossa História.» Estávamos a dois anos daquela data derradeira que aparece num famoso “horóscopo” já aqui citado. Mas cabe lembrar que o nosso Poeta e perito astrólogo já por 1915 sentenciava peremptório: « Não há Portugal: há uma mistura de “estrangeiros do interior” a governar-nos e a estropiar-nos o resto do que somos.»

Se o leitor e eu não cremos possível razoadamente assentar firme juízo em tão aéreos e alevantados castelos de “constelações culturais e civilizacionais”, o que fazer com a tese? Pois analisá-la nos seus termos, conferir com ela os nossos próprios sentimentos e ideias, e ver o que pragmaticamente se pode fazer com ela na vida individual e colectiva. Vejamos um exemplo só, por hoje; a questão é das que transcendem, se não um “ensaiozinho”, por certo que muito um postalzinho de blogue.

Um ponto interessante da tese é o “menos por efeito de um decadentismo político”. De facto, o sentimento de ver a pátria “metida no gosto da cobiça e da rudeza / de uma austera, apagada e vil tristeza” vem pelo menos do Épico, aqui concorde com o seu grande contemporâneo Sá de Miranda. Deste, afastado da Corte em terras de Basto, diz Miguel Real, a págs. 43: «vivendo na solidão e no silêncio político uma espécie de auto-culpabilização ou expiação do que Portugal poderia ser ou ter sido (tendo todas as condições para isso), mas não é ou não foi devido à brutalidade da rapinagem económica e especulativa das classes económicas intermédias e da funda ignorância histórica e cultural das elites portugueses.» Seriam estas a “gente dura e endurecida” a que Camões se doía de falar. Porém, se recuarmos à pág. 37 lemos: « Com a centralização régia de D. João II, a transformação da empresa dos Descobrimentos em empório comercial e o Império concebido como simples estratégia militar internacional, nasce o primeiro momento do divórcio…» Recuamos, pois, de D. João III a D. João II. E, por falar em “divórcio”, terá sido mesmo o “primeiro”? Então e o “divórcio” entre o infante regente D. Pedro e os senhoriais que lhe opuseram D. Afonso V, até ao sanguinoso desfecho de Alfarrobeira? E entre os partidários de D. Beatriz e os de D. João, Mestre de Avis? Entre D. Afonso IV e o filho e familiares de D. Inês de Castro? Entre D. Dinis e o filho D. Afonso IV? Entre D. Afonso III e os parciais fiéis a D. Sancho II? Entre D. Sancho II e os bispos? Entre D. Sancho I e as irmãs? Entre Afonso Henriques e sua mãe? Tudo divórcios e todos litigiosos. Eis um facto muito interessante da nossa História, e poucas vezes sublinhado: - é que esta nação pequenina e aparentemente coesa em Estado independente há quase nove séculos, tem vivido desde as origens em constante conflito interior e mais ou menos aberta guerra civil. Até hoje, aos nossos tempos dos “estrangeiros do interior a estropiar-nos o resto do que somos”. Também aqui assoma, noutro sentido, o “complexo viriatino” de que fala Real, se lembrarmos, a propósito, que o lusitano Viriato terá morrido às mãos de lusitanos e não dos romanos.

Portanto, e para já, um ponto a fixar. – Temos sentimentos de “decadência” desde há pelo menos cinco séculos. E desde há nove temos vivido sempre em conflitos domésticos adentro da nossa “pequena casa lusitana”. E cá estamos, cá continuamos. Queixosos e sempre mais ou menos zangados uns com os outros. Parece-me que há uma lição importante a tirar daqui… no próximo postal.

Entretanto, não deixemos de salientar o ponto mais interessante – e preocupante – da tese: a desumanização ética e a tal “rapidíssima submersão…” Aqui, sim, acho eu que Miguel Real deu rebate justo, e temos mais ameaçadores entonos do que nos periódicos repiques de finis patriae. O que está em causa é mais do que a naturalidade portuguesa: - é a natureza humana.


[ Nigel Parker fotografou uma árvore, não a floresta… ]

segunda-feira, setembro 22, 2008

"Praia de Mira, 22 de Setembro de 1987"

« Portugal não parece o mesmo. Em meia dúzia de anos perdeu o carácter. Quem familiarmente lhe conhecia as feições que o singularizavam, fica espantado quando agora o percorre. Tudo mudou. As casas, as ruas, os trajes, os hábitos. Da praia de Mira que trazia na memória, e onde, num cenário mágico e a comungar com almas que o mereciam, vivi algumas das horas mais autênticas da minha vida de poeta, restam o mar, sempre revolto, e a capela, de madeira ainda, como os castiços palheiros de antanho. E é neles que consolo os olhos desiludidos. O velho oceano, na sua imutável e fascinante inquietação, e o templozinho de tábuas, nas sua incorrupta e amorável rusticidade, dão não sei que razão calada ao meu espírito desencantado dum progresso que não sabe melhorar sem desfigurar. »

Miguel Torga, Diário, vol. XV.

domingo, setembro 21, 2008

"Palheiros de Mira, 21 de Setembro de 1948"

« (…) À proa, a vê-los remar compassadamente ou a perscrutar os horizontes, sinto-me feliz, solidário com eles na mesma aventura, embalado no mesmo berço traiçoeiro do mar. Fernando Pessoa, depois das Descobertas, ficou desempregado. Eu não. Eu corro dos camponeses de Trás-os-Montes aos marítimos do litoral, a colaborar nas suas fainas e a esperar. Tenho a certeza de que a história de Portugal continua.»

Miguel Torga, Diário, vol. IV.

quinta-feira, setembro 18, 2008

POESIA E CIDADANIA


Encontra-se já disponível ao público leitor português uma obra rara, se não mesmo única, e que logo por isso não mereceria passar sem reparo. Trata-se de uma antologia de 90 poemas das tradições literárias dos países de língua oficial portuguesa, desde o século XVI aos nossos dias, organizada em torno do conceito de Cidadania. O título, tirado de um verso de Mário Cesariny, é O Nosso Dever Falar e são seus autores Alexandre Dias Pinto, Carlota Miranda, Orlanda de Azevedo e Pedro Valente.

A obra pode ser apreciada como uma antologia poética em si mesma, contendo uma amostra significativa e proporcionalmente bem distribuída de autores lusófonos, que decerto agradará aos estudiosos e amadores deste género literário. De facto, é uma amostra relevante e capaz de responder à seguinte questão: - nas particulares circunstâncias de tempo e lugar que viveram, que aspectos da vida social é que mais feriram a sensibilidade dos poetas e como é que estes lhes responderam? Mas o livro tem outro propósito, não menos importante e valioso. Os autores, sendo professores, não esqueceram os seus alunos – “que são os destinatários principais desta obra” – nem as finalidades pedagógicas duma formação cívica e da educação para a cidadania, que alegadamente se tem procurado promover na escola portuguesa, até a nível do currículo formal. (Cabe aqui uma palavra de reconhecida lembrança a um Ministro da Educação – José Augusto Seabra – que foi o primeiro, atenuados os frenesins propagandísticos do sectarismo revolucionário pós-1974, a tentar promover seriamente uma formação cívica na escola. Já o tínhamos lembrado aqui, a propósito de um escritor português que teria entrada obrigatória numa antologia desta espécie com textos em prosa, e que os autores desta de poesia bem nos poderiam dar a seguir…)

E assim é que a presente colectânea apresenta um grupo de 30 poemas acompanhados, cada um deles, de instrumentos didácticos de apoio à leitura e interpretação dos textos, disponibilizando também actividades de motivação; roteiros de leitura dos poemas; comparação e propostas de reflexão, discussão e produção de respostas pessoais e criativas aos poemas apresentados. E assim sendo, temos achada e tem de ser sublinhada a maior valia desta obra: o ser ela, em si mesma, um caso exemplar de intervenção cívica. Exemplar e oportuno.

Sobre tão instante e urgente oportunidade, não posso deixar de citar um importante trecho do prof. dr. Manuel Gusmão – que prefacia o livro e é ele próprio um dos poetas antologiados:

« Embora vivamos numa época em que se acumularam imensas forças sociais e humanas, de natureza científico-técnica e cultural, estamos também a viver tempos em que os poderes de decisão parcem cada vez mais longínquos e cada vez mais empenhados na redução de direitos que ainda recentemente eram considerados como adquiridos civilizacionais, por diferentes grupos culturais.
« Esta situação, a tendência para uma submissão “inexorável” do poder político ao poder económico, o desequilíbrio injusto na distribuição social de direitos e deveres, a ideia profundamente degradada que os cidadãos parecem ter da acção “política” e dos “políticos”, os sinais de crise da representação política na Europa, a quebra das relações de pertença e a fragmentação da figura do cidadão nos seus diferentes “papéis” – o de consumidor, utente, cliente, telespectador, eleitor, etc. – tudo isto parece tornar necessária a Educação para a Cidadania e, ao mesmo tempo, coloca-lhe algumas exigências para que não fique prisioneira da endoutrinação. Uma dessas exigências é a da exposição da pluralidade das versões de cidadania; uma outra deverá ser a explicitação tão rigorosa quanto possível das diferenças que marcam essas versões.
« Uma exigência e uma dificuldade decisivas surgem quando assumimos que a educação para uma cidadania democrática deverá ser ela própria uma formação democrática. A resposta poderá estar na procura e na participação dos estudantes enquanto protagonistas da sua aprendizagem e sujeitos activos da avaliação. Esta participação não prescinde do professor, antes implica a sua destreza, a sua arte e a sua honestidade intelectual. »

Permita-se-me um leve comento sobre a “dificuldade decisiva”, no quadro da situação acima descrita. Infelizmente, a “participação dos estudantes enquanto protagonistas da sua aprendizagem” é uma condição ideal cada vez mais problemática, se os “principais destinatários” deste livro e do acto educativo têm cada vez mais dificuldades em suportar a escola (mais precisamente: as “aulas”, de qualquer tipo que sejam). São ponderosas dificuldades de vária ordem, das quais ocorre imediatamente uma, por mais e mais patente aos estudantes e às famílias: as saídas profissionais não compensam (para a grande maioria) os muitos anos de vida passados na escola. É uma situação literalmente quase sem saída. Portanto: que “formação cívica”, para jovens que (na grande maioria) terão cada vez menos trabalho, e esse precário e explorado, na sociedade a que pertencem? Mas, sublinho, esta é apenas uma dificuldade, socialmente a mais aparente e a mais ligada à natureza e função paradigmáticas da instituição escolar. (Outra tem a ver com aquela denúncia de Torga aqui posta no passado 12, com a diferença de que hoje vamos vendo melhor que a “comunidade de solidões” não é comunidade nenhuma… e as “impulsões” se fixam e exaurem na inerme apatia duma insensibilidade embrutecida, ou tolhida pelo medo… ) Por isso e pelo mais, bem se apela à imprescindibilidade e habilidade dos srs. professores (e, já agora, dos pais… se eles não estivessem mentalmente cada vez mais parecidos com os filhos). Seja. Desde que a “destreza” e a “arte” dos srs. professores ao menos consiga satisfazer uma elementar e básica condição de qualquer eficácia pedagógica: - em situação de aula, serem uma autoridade capaz de suscitar o respeito dos alunos, e preparada para proteger os interesses dos que têm uma mínima boa vontade de aprender. É que, hoje mais que nunca, a “cidadania” e os “direitos humanos”, ou começam no vivo e exemplar comportamento imediato dos responsáveis próximos, ou são contraproducentes aos valores que pretendem servir.

Tudo isto é extrínseco aos autores deste livro. Mobilizando e utilmente preparando o acesso a vozes que importa ouvir, os autores cumpriram um exemplar acto de cidadania. Bem hajam por isso. É connosco agora o… nosso dever falar!




[ N. B. Como disse, esta antologia trata de poetas lusófonos, não exclusivamente de portugueses. Estimaríamos saber que alguma competente entidade interessada em serviço público, algum dos mil e um institutos, comissões, secretariados e fundações, não se dedignou apreciar a importância desta obra e promover a sua divulgação nos países lusófonos. ]

terça-feira, setembro 16, 2008

"S. Martinho de Anta, 16 de Setembro de 1961"

« (…) É o dom supremo da Natureza: dama de grande senhoria, tudo o que vive na sua intimidade se dignifica também. No meio de panoramas de uma só cara, dificilmente a safadeza se atreve a mostrar as duas habituais. Diante dos montes que devolvem o eco de cada afirmação, ninguém é capaz de se contradizer. Daí a sensação de pureza e nobreza que nos dão as criaturas rurais, no trabalho ou no ócio. As cidades são artifícios monumentais de sofreguidão e cimento; e os homens que as habitam – artifícios miniaturais de carne e pensamento. E quem nelas sentir ainda a nostalgia do simples, do espontâneo, do verdadeiro, tem de lhes fugir sempre que possa e regressar à terra. Quando mais não seja, para verificar até que ponto chegou na degradação… »

Miguel Torga, Diário, vol. IX.

domingo, setembro 14, 2008

"Chaves, 14 de Setembro de 1977"

« É uma tristeza verificar que a política se faz na praça política com demagogia e nos bastidores com maquinações. E mais triste ainda concluir que não pode ser de outra maneira, dada a natureza da condição humana, que nunca soube distinguir o seu egoísmo do bem comum e vende a alma ao diabo pela vara do mando. A ambição do poder não olha a meios, pois todos lhe parecem legítimos, se eficazes. E teve e terá sempre uma máscara cativante para afivelar nas tribunas cívicas e um baralho viciado para jogar nos corredores do senado. »

MIguel Torga, Diário, vol. XIII.

sexta-feira, setembro 12, 2008

"Chaves, 12 de Setembro de 1978"

« Bem quero, mas não consigo alhear-me da comédia democrática que substituiu a tragédia autocrática no palco do país. Só nós! Dá vontade de chorar, ver tanta irreflexão. Não aprendemos nenhuma lição política, por mais eloquente que seja. Cinquenta anos a suspirar sem glória pelo fim de um jugo humilhante, e quando temos a oportunidade de ser verdadeiramente livres escravizamo-nos às nossas obsessões. Ninguém aqui entende outra voz que não seja a dos seus humores. É humoralmente que elegemos, que legislamos, que governamos. E somos uma comunidade de solidões impulsivas a todos os níveis da cidadania. Com oitocentos anos de História, parecemos crianças sociais. Jogamos às escondidas nos corredores das instituições. »


Miguel Torga, Diário, vol XIII.

Professor, a colocação e o cenário de guerra

Tinha ouvido dizer que um professor numa aula problemática gera níveis de ansiedade equivalentes aos de um soldado em campo de batalha. Achei exagero. Mas as situações têm contornos semelhantes. Veja-se como a colocação de um jovem professor e o destacamento de um soldado para a frente de combate se assemelham. Descubra as diferenças.
(Por inépcia minha, não fui capaz de "encaixar" aqui o vídeo.)

quinta-feira, setembro 11, 2008

CARTAS ITALIANAS


Na Europa, os séculos XVI-XVII começaram a preparar os caminhos que o XVIII inflectiria decisivamente para a posição e trajectória que levamos hoje, em Portugal e no mundo. Ao leitor curioso de como viemos parar aqui e de qual o sentido dessa trajectória, as Cartas Italianas de Luís António Verney (1713-1792) abrem-nos de par em par as portas dos laboratórios onde se ensaiavam os catalizadores da profunda mutação cultural cuja reacção em cadeia ainda hoje vivemos e viveremos. O convicto experimentador da bondade dessas reacções era um português que, aos 23 anos, trocou a universidade de Évora por Roma, onde concluiria o curso de Teologia e Direito Canónico. Com 31 anos de idade, já tinha redigido as dezasseis cartas que constituíam um tratado completo e sistemático de uma reforma para a escola portuguesa, em todas as matérias e graus de ensino: o célebre Verdadeiro Método de Estudar, publicado em 1746.

As oito cartas, escritas entre 1765-66, agora apresentadas e traduzidas do italiano ao nosso vernáculo por Ana Lúcia Curado e José Manuel Curado, são a viva demonstração de que o escopo reformador estava longe de se limitar apenas ao campo pedagógico: ia desde as relações internacionais do Estado português até aos hábitos de vestuário das pessoas e tipos de rodas das carruagens que andavam nas nossas estradas. E mostram também que este português, que viveu no estrangeiro 56 anos, sem nunca mais ter voltado à terra em que nasceu, teve sempre Portugal diante dos olhos. Talvez nos tenha visto melhor que muitos que nunca de cá saíram. Às cartas “italianas” (escritas por Vernei a um correspondente português anónimo, e que serão talvez cópias de originais portugueses que se perderam), os tradutores juntaram nesta edição duas importantes portuguesas, escritas em 1751 e 1753: a primeira, sobre questões de crítica literária, de muito interesse para os estudiosos da nossa literatura de setecentos; e uma outra que é um longo diagnóstico da vida intelectual portuguesa na época, e bem poderia ser uma apostilha a uma moderna reedição do Verdadeiro Método.

Não vou cansar o leitor com o elenco de todos os assuntos abordados por Vernei em cada uma das restantes cartas traduzidas. Já ficou sugerido que são muitos e surpreendentes, de tão variados. Bastará dizer (aproveitando uma imagem feliz dos editores no respectivo prefácio) que são janelas escancaradas para um quadro pitoresco e minucioso de muitos aspectos da vida social e mental da época; um documento imprescindível para o historiador profissional como para o simples amador curioso. Janelas adentro, vemos bem que na casa é o tal laboratório que mais nos interessa – porque criou a paisagem onde habitamos hoje. De facto, se olharmos cá para fora, reconhecemos sem dificuldade um bem marcado trilho que parte da casa do Vernei preocupado com o estado das nossas estradas e a terra portuguesa de hoje, toda enfaixada de alcatrão.

Umas palavras são devidas – porque merecidas – aos tradutores das Cartas. Vernei foi obrigado a exilar-se para pôr a carruagem portuguesa a andar ao ritmo da Europa, mas, que eu saiba, não lhe pesou muito nunca mais voltar, mesmo quando o seu amigo Pombal era dono e senhor da situação. Estes dois jovens professores da Universidade do Minho, que representam do melhor que a nossa cultura universitária tem hoje, podiam estar a fazer uma brilhante carreira profissional em alguma das melhores universidades estrangeiras – mas preferiram ficar e apostar que, mesmo nas actuais circunstâncias, a cultura portuguesa pode chegar ao nível do que de mais exigente e de melhor se faz lá fora. E é facilmente argumentável que as circunstâncias sociais e culturais do presente e próximo futuro português são muitíssimo mais adversas que no tempo de Vernei. No século XVIII tínhamos uma cultura popular viva, e a erudita, se bem que não agradasse ao figadal inimigo da Inquisição e dos jesuítas, estava longe de ser desprezível. Hoje, temos uma cultura popular morta, e a erudita, graças à calamitosa política do ensino básico e secundário, em vias de quase geral apagamento. Basta citar o exemplo do ensino das línguas e cultura clássicas. E é duma cerração assim que logo sobressai o contra-exemplo brilhante da jovem Ana Lúcia Curado, que foi a última doutoranda e (pelo que vemos) pode ser a legítima herdeira dessa grande senhora das Humanidades que foi a Profª Drª Maria Helena da Rocha Pereira. A tese da novel doutora pela Universidade de Coimbra sobre As Mulheres em Atenas traz decisiva e dificilmente ultrapassável contribuição para o conhecimento de um até aqui recôndito e difícil objecto de estudo: a vida pessoal e social da mulher grega. Pois agora, através de uma minuciosa e argutíssima análise das alegações em processos judiciais produzidas pelos grandes causídicos atenienses (oradores como Lísias, Isócrates, Demóstenes, Ésquines e outros), Ana Lúcia Curado consegue dar-nos a ver a vida concreta, quotidiana das mulheres (e homens) atenienses de há dois mil e quinhentos anos tão bem ou melhor ainda que as Cartas de Vernei a vida europeia e portuguesa de há pouco mais de duzentos. Felizmente que a sua tese – espera-se que ainda neste corrente mês de Setembro - sairá editada para instrução e prazer dum mais vasto público.

Quanto ao professor Manuel Curado, é apenas jovem na idade e vitalidade dum operosíssimo labor: o vasto e variado currículo que já granjeou é o de um veterano mestre da alta cultura universitária portuguesa, capaz de ombrear com vantagem entre os melhores de qualquer das melhores universidades do mundo. Já aqui neste Tonel tivemos ocasião de assinalar um dos seus mais importantes livros – Luz Misteriosa. A Consciência no Mundo Físico (2007) –, que é uma reprodução abreviada e revista da parte mais substanciosa e original da tese de doutoramento aprovada cum laude pela Universidade de Salamanca. Que eu saiba, na bibliografia portuguesa, foi a primeira obra que levou a cabo, na perspectiva dos desenvolvimentos da tecnociência mais de vanguarda, um inquérito sistemático e de fundo ao problema da (in)discernibilidade entre a consciência que supomos “natural” na espécie humana actual – e a chamada “inteligência artificial”. Porém, a importância do livro está na própria tese que defende – inesperada, radical e capaz de surpreender o leitor até ao limite do suportável. Por mim, poucos livros tenho lido que me suscitaram tantas reservas, perplexidades e objecções como este. Mas ser desafiadora ao ponto de fazer tremer as nossas mais fundas convicções, sempre foi a virtude da melhor filosofia.

quarta-feira, setembro 10, 2008

Assi se habla en España



O chistoso soneto do poeta barroco espanhol Lope de Vega brinca com a mudança de estilo e linguagem que, em pouco tempo, se operou na literatura espanhola: a clareza de linguagem do estilo renascentista deu origem ao estilo rebuscado e enredado da literatura barroca. No soneto, os dois representantes máximos da poesia do Renascimento espanhol (Garcilaso de la Vega e Juan Boscán) mostram-se surpreendidíssimos quando encontram uma estalajadeira que, seguindo a nova moda literária, já se exprime segundo o melhor estilo barroco.



Boscán, tarde chegamos. – Há pousada?
- Chama aí da posta, Garcilaso.
- Quem é? – Dois cavaleiros do Parnaso.
- Não há onde nocturnar palestra armada.

- Não entendo o que diz esta criada.
Madona, que dizeis? – Que afectem passo,
que obstenta limbos o fingido caso
e o sol depinge a porção rosada.

- Estás em ti, mulher – Negou-se ao tino
o hópede ambulante –. Que em tão pouco
tempo tal língua entre cristãos caia!

Boscán, perdemos ambos o caminho,
Perguntai por Castela, que estou louco,
Ou não saímos ainda da Biscaia.


(A tradução do poema é de José Bento; o retrato, de Lope de Vega.)

segunda-feira, setembro 08, 2008

"Tinhela, Chaves, 8 de Setembro de 1989"

« Cá ando a inventariar, numa ternura estrangulada, o Portugal remoto e arcaico que nos resta. Um Portugal sóbrio e digno, de solares arruinados e calçadas gastas pelos socos do tempo, que porfia na sua identidade profunda, a respirar a custo ao lado dum outro espalhafatoso e presumido que o nega de raiz e é apenas uma pátria de férias. (…)

A paisagem planáltica, de restolhos e carvalheiras, doirada pelo sol da tarde, abre-se majestosa em todas as direcções, soberanamente alheada do descalabro e profanação das povoações que a pontuam. E é na certeza da sua eternidade que sossego. As circunstâncias fazem e desfazem. Ela permanece. Sempre harmoniosa e sempre disponível para assimilar ou rejeitar as obras humanas que a mereçam e honrem ou não. »

Miguel Torga, Diário, vol. XV.

sexta-feira, setembro 05, 2008

TO GAR AUTÓ NOEIN ESTÍN TE KAÍ EINAI


Não, caro leitor, não são ininteligíveis sons articulados por alguém que bebeu imoderadamente do fino aqui no Tonel!

Serão palavras dalguma divindade, uma linguagem estranha aos humanos? Intérprete delas, quem as proferiu em grego acreditava que sim. E quem era este grego? – « …aquele ser único que é Parménides. Parménides parece-me ser “venerável” (aidoios) e ao mesmo tempo “temível” (deinos), como diz Homero. De facto, encontrei-me com o homem quando eu era muito novo e ele muito velho, e pareceu-me que tinha o porte duma raça nobre. » Eis o que Platão faz dizer a Sócrates, citando dois adjectivos de um verso da Ilíada, que fala de um deinê te kaí aidoie theós – “um deus que se teme e reverencia”. Nada mais, nada menos. Tal era o respeito que os dois atenienses – o espadaúdo descendente dos reis de Atenas (não poucas vezes mordido pela canina irreverência do nosso Diógenes, como já vimos aqui) e o seu mestre Sócrates – tinham pelo filósofo de Eleia. E já que lembrei a luz da lanterna de diogénio, que procurava um homem sob a luz do Sol, as palavras citadas sugerem que Sócrates poderia ter sido mais afortunado na busca que o nosso patrono.

Parménides traduziu a voz da divindade num poema em versos hexâmetros, como os da epopeia homérica. É, de facto, uma deusa, anónima, que fala na quase totalidade dos versos que chegaram até nós em 16 fragmentos. Deste, o canonicamente considerado como 3º contém apenas meio verso. Costuma em português traduzir-se assim:

« Pois o mesmo é pensar e ser »...

Tal é o título deste postal, e eis o que diz a deusa. Parece-nos uma voz familiar? Nos caminhos habitados pelo nosso pensamento habitual, pensamos (na verdade) o que é (realmente/a realidade) ? E por quais critérios, umas vezes, acreditamos que pensamos o que é e, outras vezes, o que não é ? Então, o que pensamos e o ser nem sempre são “o mesmo”? (Se é que o que pensamos é “o pensar”, ou um pensar que pensa como nós que pensamos, quando pesamos que é pensar, ou pensa o mesmo que pensamos, etc.)

Ora bem, aqui está: se começássemos a pensar na palavra da deusa, logo começaríamos a pegar nos fios (-pensar-ser-não ser-verdade-realidade-aparência-crenças-identidade-) e a entretecer o grande tecido fiado ao longo dos tempos no tear da tradição intelectual europeia. O leitor fique descansado, que não o vou fazer: posso desbordar todos os limites do postal blogueiro, mas não chego a tanto! O que tenho de dizer é que, com apenas meio verso, o grande Parménides (ou a deusa) condensou a legenda e traçou o temporal destino de tudo isso a que chamamos “filosofia”, e da filha que esta pariu e baptizámos com o nome de “ciência”.

Digo também, com o grande sofista Górgias, que Platão era um grande ironista. Pois que pensar de um indivíduo que nos diz – por escrito – que o mais importante do que tem a dizer e tanto lhe custou a descobrir, não o dirá nunca… por escrito?! Pois se falando por cerca de 20 anos com um Aristóteles se queixou de não ter sido entendido, que remédio lhe restava, passando o tempo e chegando a morte para lhe cortar a voz? Escreveu… E, como era um grande escritor, escreveu nas linhas e nas entrelinhas. E o que ele escreveu, mais que uma vez, foi que Sócrates (que nos parece o tipo excelente do ironista), quando aparece em cena Parménides, fica pequenino (“muito novo”), teme-se de falar do pensamento do Eleata e, de facto, cala-se e é substituído por outras personagens menores (uma delas chama-se “Aristóteles”, outra tem o mesmo nome “Sócrates”…). E quando Platão não escreveu, encarregou-se a tradição de escrever isto: falecido mestre Sócrates, o discípulo Platão dirigiu-se e refugiou-se junto dum condiscípulo socrático – Euclides, que, na cidade de Mégara, continuava os ensinamentos do mestre ateniense, neste notável sentido: unia o eticismo socrático com o ontologismo parmenidiano. Ora, no poema de Parménides, só há um único vestígio explícito, aliás reduzido a uma única palavra (o adjectivo stugeroio, “vergonhoso”, “repugnante”, “ascoroso”), de uma qualquer conotação ou conexão com uma axiologia ou uma ética humanas… Que quero eu dizer com tudo isto? Que deviam ter muito cuidado os intérpretes que falam dum “parricídio” cometido por Platão relativamente ao “pai” Parménides, e tanto mais quando quem fala em “parricídio” e em “pai” - num diálogo em que se trata de caçar O Sofista no mesmo terreno em que este caça, e com as mesmas armas - é uma protagonista personagem nomeada apenas como “estrangeiro de Eleia”; isto é, uma personagem que, tirada a máscara, pode mostrar o rosto do próprio… Parménides.

Mas deixemos os intérpretes, e preocupemo-nos mais connosco. O que quero dizer é que devíamos ter muito cuidado quando ouvimos uma voz (a voz de uma deusa) vinda lá de há 2 500 anos a falar connosco sobre o que é e o que não é. Como nós os humanos somos uns animais palradores, que passamos a maior parte dos nossos dias a sentenciar sobre o que “é” e que “não é” (assim ou assado, frito ou cozido), a voz da deusa pode parecer-nos tão familiar que não reparamos, não vemos. Não vemos o quê? Pelo menos, que os deuses, quando nos falam, podem dizer-nos coisas bem estranhas, que precisam de ser bem vistas e medidas, como as do oráculo délfico – que levaram o prudente Sócrates a investigações que duraram uma vida (todas as vidas… as de cada um de nós). Pelo mais, que o que a deusas “pensa” que é ou que não é pode estar muito afastado dos caminhos por onde nós os mortais erramos a pensar que é ou não é, vagueando como uma “multidão de surdos e cegos, sem entendimento” (palavra de Parménides)…

Então que há-de dizer um pobre homúnculo a este titã triunfador de Ícaro, que nos saiu de Eleia num esplêndido carro de muitos e bem treinados cavalos, obedientes à competente brida das sedutoras “filhas do Sol”? Pois apenas lembrar um comezinho facto, que deve ter passado despercebido ao supremo ironista que foi Parménides. – Pouco mais ou menos pela mesma altura em que o titã se metia a altas cavalarias, cá em baixo nas terras da Palestina uns obscuros sacerdotes ou doutores da Lei passavam a escrito umas palavras, que os famosos Setenta tradutores do séc. II a. C. verteriam em grego e opuseram às poéticas revelações do grego Parménides. Estão no livro do Êxodo, capítulo três, versículo catorze…

Parece que falar de poesia a propósito do poema do Eleata, só fechando os olhos ao cego Homero, de tão inábil e fruste é a arte literária do filósofo, segundo os entendidos. Pois mesmo assim (mais uma ironia) dizem que lá tem um dos mais belos versos da poesia grega de todos os tempos. É este:

Nuktifaés perí gaián alômenón alótrion fôs.

( Luz alheia ao redor da terra errante alumiando a noite… )

quinta-feira, setembro 04, 2008

“Coimbra, 4 de Setembro de 1956”

« Há em mim uma raiz anarquista que me não deixa tolerar o poder. Sou contra ele porque degrada tudo: quem o exerce e quem o tolera. Corre-se o país de alto a baixo, e que tristeza de paisagem humana! A rasoira da mediocridade nivelou a seara numa pequenez outoniça. Não se ouve uma voz singular no murmúrio colectivo, nenhum grito se sobrepõe ao coaxar monótono do charco. (…) »

Miguel Torga, Diário, vol VII.

quarta-feira, setembro 03, 2008

"Carvalhelhos, 3 de Setembro de 1989"

« Horas e horas de correria por este Barroso a cabo, num Domingo de romarias, na mira de assistir mais uma vez a uma chega de toiros. (… )
Celebração colectiva, a turra é a mais sagrada cerimónia que se pode presenciar nestas paragens, onde cada acto tem a profundidade dos tempos primordiais e não há divindade sem terra nos pés. E eu sou uma natureza religiosa, sedenta de transcendente, que aprendeu nas grutas de Altamira que ele pode ter a figuração de um bisonte e é sempre uma resposta luminosa a perguntas obscuras do instinto. »

Miguel Torga, Diário, vol. XV.

terça-feira, setembro 02, 2008

"Caldelas, 2 de Setembro de 1948"

« O artista de agora, se quiser persistir, tem de ser um homem de acção. – Mas que acção?Ajudar a construir um mundo que o nega? Ajudar a destruir um mundo onde ele próprio já não vive? A acção dum artista é fazer a sua obra. »

Miguel Torga, Diário, vol. IV.